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Uma reforma para Fortaleza

Batista de Lima


Fortaleza está se tornando nossa demência. Ficou grande sem se preparar para o engrandecimento. Minha geração AI-5 que muito bradou pela Reforma Agrária hoje brada por uma Reforma Urbana. Como a Agrária não foi feita, o sertanejo fugiu do campo e apinhou-se no subúrbio. Agora temos mais de duzentas favelas em nossa cidade, formando um verdadeiro cinturão sufocante em torno do Centro Histórico. Daí que transitar pelo centro de Fortaleza não é mais recomendável para quem não tenha nervos de aço. Tanto faz ser pedestre como motorizado. Os espaços urbanos de nossa capital sumiram do mapa.

As calçadas desapareceram, submersas sob um oceano de pequenos comerciantes ambulantes. O pedestre tem que disputar com os carros o pouco espaço das ruas engavetadas. A mobilidade humana desumanizou-se de tal forma que ruas centrais como Barão do Rio Branco e Senador Pompeu não lembram mais nem as personalidades que lhes nominaram. Se vivos fossem, o Barão e o Senador mandariam tirar seus nomes das placas. Afinal, muitas insônias, gastrites, úlceras, atropelamentos, ataques cardíacos já aconteceram em consequência daqueles tapetes asfálticos que parecem levar ao inferno de Dante.

Esse desabafo inicial não é propriedade do cronista, é o que desabafa a população, inclusive autoridades, engenheiros, urbanistas e arquitetos. A pergunta, no entanto, é: tem solução esse problema? É evidente que tem. É no entanto uma solução que demanda uma série de estratégias para se alcançá-la. A primeira delas, a mais urgente é a urbanização das favelas ou dos bairros que lhes ficam mais próximos. Fortaleza não pode mais ser uma cidade só com um centro para onde tenha de convergir toda a população. Ela precisa ser um conjunto de cidades formando a grande metrópole. Cada bairro precisa dispor de serviços essenciais que atendam a educação, a saúde e os compromissos burocráticos da população. É essencial a presença da escola, do hospital, do cartório, do supermercado e finalmente de tudo aquilo que o cidadão precisa ir procurar no Centro. Um exemplo é o conjunto dos bairros que estão entre o rio Cocó e as Seis Bocas. São bairros que dispõem de todos esses serviços. Acontece que o Pirambu, muito mais antigo, não dispõe desse aparato urbanístico.

Outro grito da população é com relação à violência, principalmente entre a população jovem. Assaltos e mortes, relacionados ao tráfico de drogas, à miséria e à falta de perspectiva de vida, localizam-se principalmente nos bairros menos assistidos. Daí que se constroem presídios e mais presídios que se entopem de presos. Ora, por que não se constroem escolas em vez de prisões? Quando um bairro for destacado pela delinquência, principalmente de menores infratores, o primeiro a se fazer como solução é construir uma escola de tempo integral. A escola retira o adolescente da rua e lhe dá perspectiva de futuro.

Sempre que citamos essa solução, gestores públicos alegam o grande investimento que se tem de fazer para a construção e manutenção dessas escolas. Entretanto não se lembram de que uma casa de detenção também implica gastos similares e não educam, pelo contrário, são escolas de criminalidade. Adolescente desocupado no meio da rua é aconchego para a delinquência. Ele precisa estar em algum local de formação: uma escola, um centro comunitário, uma igreja, qualquer equipamento de formação que o livre de ser alvo da marginalidade. Os bairros, pois, precisam desses equipamentos.

Outro setor que precisa ser reformado é o conjunto de praças que a cidade possui. Essas praças abandonadas estão principalmente na periferia. A questão é que, quando se reforma uma dessas praças quem primeiro chega, antes da população, é a lanchonete, o bar improvisado e pequenos comerciantes orientados por políticos, cabos eleitorais ou líderes comunitários do bairro. A praça termina sendo privatizada e o usuário popular da comunidade perde o direito de utilizá-la. A praça é do povo, das crianças, dos idosos, dos jovens. É um ambiente de se estar, de se permanecer, de se gostar de onde moramos.

Além da reforma das praças, há a necessidade de abertura de vias de trânsito. Há tempos que não se constroem longas avenidas em Fortaleza. Acredito ter sido a Via Expressa a última delas, mesmo assim a frota de veículos da capital aumenta aos milhares a cada ano. Há poucas artérias ideais para o grande transitar de veículos. Além desse problema há o fato de que os órgãos que reformam as ruas e avenidas e os que instalam canalizações para a água jamais se entendem. Não fazem um trabalho conjunto o que leva às vezes a encontrarem-se, em avenidas de muito trânsito, várias interrupções que se eternizam.

Diante de tantos percalços, a saída seria ir à praia. Acontece que a praia virou um mar de barracas de particulares que não se sabe que direito de propriedade usufruem sobre um bem tão público como a beira do mar. É preciso também urbanizar a orla marítima, afinal o fortalezense precisa também vislumbrar os "verdes mares bravios" de sua terra. Precisa também de gestores que preservem a memória da cidade, os espaços de que a população precisa para encontrar sua história e se mirar naqueles que um dia dispuseram de uma cidade onde passeavam, iam às praças, aos cinemas e ao teatro com a certeza de que voltariam para casa com a satisfação de habitar uma cidade bela, uma verdadeira "loura desposada do sol".


jbatista@unifor.br

06/09/11.

 

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