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  • Foto do escritorBatista de Lima

Tributo ao professor Joaquim

Batista de Lima



Ele chegou a Fortaleza no final da década de 1940. Vinha de Lavras da Mangabeira pelo trem da RVC com uma mala de sonhos na cabeça e uma missão a cumprir: educar. Naquele tempo, o Carlito Pamplona era uma floresta de cajueiros salpicando um chão de areia. Poucas casas e muitos horizontes. Dava para ver o azul do mar de qualquer lugar, com suas dunas brancas completando a aquarela da tranquilidade. O único divertimento dos poucos habitantes dali era ouvir a Ceará Rádio Clube durante o dia e à noite ir a um pequeno cinema que tinha o nome de Carlos Câmara. Mas o cineminha entrou em crise. O proprietário o colocou à venda. Professor Joaquim comprou o pequeno prédio e montou uma escola para as crianças do Carlito. Foi assim que teve início a vida de educador de Joaquim Batista Lima. Àquela pequena escola ele deu o nome de Osvaldo Cruz, e estava ali instalada na Praça do Carlito, do lado direito da Capela de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro. Era de um lado o padre preparando as almas para o céu e do outro professor Joaquim preparando vidas para o enfrentamento deste vale de lágrimas. Assim ele atravessou toda a década de 1950 e ingressou nos anos sessenta nesse apostolado de transformação daquela comunidade semi-esquecida. Educava na sua escola toda uma juventude do seu bairro, e dos vizinhos Vila Elery, Floresta, Colônia, Pirambu, Barra do Ceará e até de outros mais distantes. Em 1966, exatamente no dia 7 de setembro, ele mudou o nome da escola para Educandário Casemiro de Abreu. O prédio continuava o mesmo, mas com a criação do ginásio e posteriormente com o científico, foi necessária uma ampliação de suas dimensões. Foi a partir daí que o Casemiro de Abreu conheceu seus momentos de maior crescimento, chegando a abrir outra sede na Barra do Ceará e uma terceira no Tirol. Professor Joaquim acreditava no que fazia e valorizava o seu bairro. Fundou a escola, casou-se com moça da sua vizinhança, a competente educadora, pedagoga e psicóloga Nair Batista Lima com quem teve sete filhos, todos educados no próprio Educandário, e hoje bem situados no mercado de trabalho, todos com família constituída. Também educou, no seu colégio, familiares seus e da sua esposa, além de conterrâneos de Lavras da Mangabeira. O resultado desse apostolado educacional foi a formação de, pelo menos até agora, quatro gerações de cidadãos que se destacam hoje nos mais variados setores da vida social. São juristas, militares, professores e, principalmente, cidadãos brasileiros, cônscios de seus deveres e direitos O professor Joaquim Batista, no entanto, no último dia cinco, foi requisitado pelo Pai de todos nós, para em outra dimensão, prestar assessoria na administração dos que lá se encontram, colocando em prática sua pedagogia do afeto. Disso ele sabe muito bem, tenho certeza, pois dele fui aluno e depois funcionário, como professor, por dez anos no seu colégio. Sua pedagogia foi aprendida desde quando começou seus estudos com as professoras primárias de sua terra, depois no Colégio Salesiano Padre Rolim, de Cajazeiras, e, em seguida, no Liceu do Ceará. Também aprendeu a ser educador sendo professor do Colégio Castelo, ali na Dom Manuel, por 35 anos, ou seja, até se aposentar. Aprendeu também como professor e diretor do Casemiro de Abreu. Sua saga é algo que impressiona pelos lances de determinação e às vezes até de sorte. Sua viagem primeira para Fortaleza proporcionou-lhe um desses momentos de sorte. Quando ingressou sozinho no trem que o traria à capital, sentou-se ao lado de um cidadão que puxou conversa. Foi aí que ele narrou seu sonho de ingressar no Liceu do Ceará. O cidadão argumentou sobre as dificuldades de ingresso naquele momento porque há pouco haviam ocorrido os exames exigidos. Mas o jovem renitente afirmava que entraria, que pediria ajuda a quem quer que fosse. Foi aí que aquele passageiro desconhecido lhe deu seu cartão e prometeu ajuda. No cartão estava escrito Martinz de Aquiar, catedrático do Liceu do Ceará. Numa oportunidade seguinte, não tendo onde dormir pediu agasalho por uma noite no Colégio Castelo, ao Padre Vicente Matos, depois bispo do Crato, que lhe concedeu a dormida. Depois mais uma, e foram tantas que numa ocasião um professor faltou e ele foi substituí-lo, ficando por mais de três décadas como professor dali. Depois ainda levou alguns parentes para lecionar naquele estabelecimento. Assim foram se sucedendo os episódios que comprovam que os escolhidos da providência têm seus caminhos asfaltados pelo sucesso. Joaquim Batista Lima abriu as portas da educação para seus parentes e conterrâneos. Todo mangabeirense, que o procurava, encontrava guarida diante das vicissitudes que a cidade grande impõe aos que vêm do sertão distante. Foram muitos que ele introduziu no mundo do saber. E muitos seguiram seu exemplo, criando colégios em Fortaleza. Houve um momento em que havia 32 colégios nesta cidade, só de filhos de Mangabeira, aquele distante distrito de Lavras. Eram tantos os colégios que criaram uma associação, ACOPAM, Associação dos Colégios Particulares de Mangabeira. Não foi só dos conterrâneos que ele cuidou. Todo o bairro do Carlito Pamplona e adjacências têm um apreço carinhoso pela sua cruzada educativa, a ponto de em muitas oportunidades insistirem com veemência pelo seu ingresso na política partidária, possibilidade a que ele sempre se negou. Sua política era de formar cidadãos através do ensino/aprendizagem que sempre proporcionou a quem o procurava. Meu tio e professor Joaquim Batista Lima nos deixou um legado valiosíssimo. Desde 1950 até neste 2009, democratizou o saber, abriu as portas do seu colégio para qualquer um que necessitasse estudar, pagando ou não, chegando ali teria aconchego. Com sua partida, sua missão não vai ser interrompida. Os familiares vão continuar com o colégio funcionando, e seus alunos o perpetuarão por toda a vida. Afinal o tesouro que deixou é valiosíssimo e está explicitado através desta bela frase escrita nas dependências do seu colégio: "A educação é uma herança que o tempo não destrói".

 

22/09/2009.

 

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