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Tempo poético em Osterne Maia

Batista de Lima


Osterne Maia é psicólogo e professor universitário, mas já foi bancário, e continua limoeirense. É difícil ser de Limoeiro e não cultivar o verso. Naquela terra, paradoxalmente, numa casa de duas pessoas três são poetas, pois as carnaubeiras e o vento fazem versos. Só para exemplificar: Luciano Maia, Virgílio e Napoleão são três poetas concebidos na mesma cama. Otacílio, Dimas e Lourival, os três irmãos Batista, se fizeram no mesmo instrumento, viola. Não é pois surpresa aparecer mais um poeta dali, banhado pelo Aracati que o mar presenteia e abanado pelas folhas das frondes carnaubeiras.

No caso de Osterne Maia, vem ele com um livro de poemas com o título “Do canto ao canto”, com 128 páginas, da Expressão Gráfica e Editora, parido já neste 2019. Todos os poemas vêm com o lugar e a data do parto. Esses lugares são Fortaleza, Apodi e Aquiraz. As datas são as mais variadas. Essa preocupação em delimitar a geografia do estro põe o leitor a refletir sobre a diferença entre poema e poesia. Afinal o poema possui o momento de sua feitura, mas a poesia vem carregada de uma ancestralidade tão mal comportada que se quer imune de cercaduras.

No Prefácio, Susana Jimenez enfatiza “o instantâneo dos agoras” que o poeta introduz nos versos apresentados. Também não deixa de lembrar que o ele escreve sob a regência do tempo. Já na Apresentação, seu conterrâneo escritor Jorge Pieiro sugere uma terceira margem que Osterne parece procurar ao fugir do tempo corrosivo. O apresentador lembra o tempo em que os dois limoeirenses ensaiavam os primeiros movimentos poéticos nas planuras da cidade com suas ruas metrificadas. Acontece que nenhum dos dois seguiu o destino decassilábico dos arcanos lidos, enveredando pela liberdade dos versos.

Uma faceta da carpintaria poética de Osterne se apresenta de forma lúdica. Seus brinquedos verbais se postam no poema como peças de um tabuleiro e vão se mexendo para matar o tempo antes que o tempo traiçoeiro venha a lhe matar. É então que se instauram a agoridade e a desidade como forma de encabrestar a volúpia do Cronos. Por isso que ele verbera: “O tempo é o espaço da minha angústia”. O lirismo que sangra de seus poemas tem uma função até terapêutica diante dessa permanente angústia diante da corrosão temporal.

Esse poeta, estreante em livro de poemas, extrai de vários momentos da vida, a matéria-prima dos seus escritos. É então que seu humanismo extrapola as cercaduras do verso e fá-lo projetar no outro. Prova e comprova que o homem é um ser linguístico, às vezes até semiótico. Independente, entretanto, de binário ou triádico, esse homem cresce no outro. Na multidão da rua ele vai em qualquer um que por ali circula. Daí que seus analistas falam em poemas filosóficos, eu diria pedagógicos. Afinal ele instaura uma pedagogia do afeto com as palavras, fazendo delas instrumento de lazer.

“Do canto ao canto” é um livro bem trabalhado. Possui o acabamento produzido com muita arte e bom gosto, graças ao tirocínio artístico de Samuel Brasileiro e Natália Maia. Já com relação ao poeta, seu trabalho maior é se equilibrar entre o simbólico poético e a racionalidade da forma. O professor e doutor produtor de muitas pesquisas científicas ousa mergulhar na estrutura profunda dos signos para cascavilhar mitopoéticas sensações. É então que ele encontra legado poético que ainda está latente, a infância. Assim ele comprova que a infância é ainda quem nos guia na maturidade.


FONTE: Jornal Diário do Nordeste - 04/06/19.


 

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