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Rejane Augusto e o eclesiástico cearense

Batista de Lima

Lavras da Mangabeira tem o privilégio de ser uma cidade cujos filhos se preocupam em conhecer sua história. Talvez pelo fato de que seu passado foi marcado por querelas políticas e mandonismo de coronéis. Isso faz com que historiadores da terra se voltem para o seu passado, trazendo para o presente a saga dos lavrenses. Daí ser interessante que se leiam as pesquisas históricas de Joaryvar Macedo, Dimas Macedo, Rejane Monteiro Augusto Gonçalves, Melquíades Pinto Paiva e Luíza Correia Lima. Esses historiadores têm o mérito de tornar Lavras, cidade cearense que, depois de Fortaleza, seja uma das mais conhecidas historicamente.

A mais recente publicação nesse sentido trata-se do livro "História Eclesiástica de Lavras da Mangabeira", de Rejane Monteiro Augusto Gonçalves. Ao tratar dos 27 vigários que chegaram a exercer o vicariato em Lavras, a autora também inclui outros detalhes históricos da cidade. Entretanto o foco de suas pesquisas localiza-se no itinerário desses padres no seu fazer evangelizador. Ela vai do primeiro deles, Padre José Joaquim Xavier Sobreira (1814-1821) até o atual, o vigésimo sétimo, Padre Benedito Evaldo Alves, que desde o ano 2000 é o pároco da cidade. Entre todos esses vigários há três deles que merecem destaque especial.

O que mais chama a atenção é o Padre Meceno Clodoaldo Linhares que por 49 anos foi vigário de Lavras. Foi o vigário que por mais tempo dirigiu aquela paróquia, tendo iniciado seus trabalhos em 1875 e ficando à frente da igreja de São Vicente Ferrer, o padroeiro, até o ano de 1924. Padre Meceno foi o primeiro sacerdote ordenado pelo primeiro bispo do Ceará, D. Luís Antônio dos Santos. Segundo Rejane Augusto, foi Padre Meceno que enfrentou, com a população lavrense, a grande seca de 1877, 1878 e 1879, poderia também ter citado a de 1915, além, do fato de conviver em Lavras com os momentos mais difíceis da política daquela cidade. Muitas questões políticas desse período foram resolvidas na base do trabuco, desde o poderio da matriarca Fideralina Augusto de Lima, passando pelos seus herdeiros, até alcançar o neto Coronel Raimundo Augusto.

Ainda, segundo a autora, o Padre Alzir Sampaio foi o segundo a passar mais tempo no vicariato de Lavras. Foram 33 anos de bons serviços prestados na condução religiosa daquela cidade. De 1938 a 1971 estendeu-se sua função em Lavras. Casou os pais deste escriba, batizou-me e ministrou-me a primeira comunhão. Também merece destaque, talvez em terceiro lugar, o desempenho do Padre Raimundo Augusto Bezerra, que foi vigário de 1924 a 1935. Padre Mundoca, como era chamado, além de ter nascido em Lavras, foi interventor na cidade, por ocasião da Revolução de 1930. Outros dois padres que por lá passaram e merecem estudo particular são Padre Joviniano Barreto, assassinado em Juazeiro, e Padre Alexandre Francisco Cerbelon Verdeixa, o famoso Canoa Doida.

Padre Verdeixa, como era chamado, foi o terceiro vigário de Lavras. Consta que em 1832 oficiou o batizado de Fideralina Augusto Lima, futura poderosa matriarca daquela cidade. O Padre Verdeixa, entre os vigários que passaram por Lavras, causou mais problemas que soluções para a cidade. Seu apelido Canoa Doida era resultado de seu caminhar apresentando um certo balanço de corpo como se estivesse se equilibrando numa canoa em águas revoltas. Certo é que sua vida foi um constante mar revolto por onde passou. Um dos seus principais inimigos fora a Presidente da Província, José Martiniano de Alencar, isso ao tempo que fora deputado provincial. Esse padre deputado, no entanto, tinha uma qualidade, segundo dizem, era intransigente defensor da ecologia.

Esse livro de Rejane Monteiro Augusto Gonçalves, publicado em 2013, com suas 270 páginas, não trata apenas da "História Eclesiástica de Lavras da Mangabeira". Ele vem trazendo dados sobre a primeira diocese do Brasil, o bispado da Bahia, criado em 1551. Depois discorre sobre a criação da Diocese de Fortaleza, em 1853, apresentando em seguida os bispos e arcebispos por ela passados: Dom Luís Antônio dos Santos (1859 - 1879), Dom Joaquim José Vieira (1883 - 1912), Dom Manoel da Silva Gomes (1912 - 1941), Dom Antônio de Almeida Lustosa (1941 - 1963), Dom José de Medeiros Delgado (1963 - 1973), Dom Aloísio Lorscheider (1973 - 1995), Dom Cláudio Hummes (1996 - 1998) e Dom Antônio Aparecido Tosi (1999 até hoje). A partir de Dom Manoel, todos foram Arcebispos. A autora, pois partiu do geral para o particular, chegando aos vigários dos distritos de Lavras.

Nesse percurso Rejane não esquece de apresentar as paróquias que foram desmembradas da paróquia de Lavras. Foram elas: a de São Raimundo Nonato, de Várzea Alegre; a de São Pedro, de Caririaçu; a de São Gonçalo do Amarante, de Umari; a do Menino de Deus, de Aurora; a de São João Batista, de Cedro; a de Nossa Senhora do Rosário, de Quitaiús; a de São Sebastião, de Mangabeira. Essa última, de Mangabeira, foi criada em 1961, tendo como primeiro vigário o Padre Raimundo Nonato Dias, filho do distrito. Para a constituição do patrimônio, exigência da Diocese do Crato, estiveram à frente dos trabalhos, personalidades do distrito: Raimundo de Souza Mangueira, José Duarte de Souza, Cícero de Oliveira Lemos, Pedro Luiz Sobrinho, José Luiz Edson, José Batista de Lima, Pedro Bernardo de Oliveira, Horácio Salvador Dias, Sebastião Pinheiro Pedrosa e Cândido salvador Dias.

Como se observa, Rejane Augusto não se restringe à história eclesiástica de Lavras. Ela vai mais além e apresenta para o leitor a formação das primeiras paróquias do Ceará, bem como seus bispados. Sua pesquisa parte de um panorama religioso estadual para chegar lá na criação da distante Paróquia de São Sebastião, de Mangabeira, distrito de Lavras. Isso demonstra ser a historiadora portadora de peculiar zelo na sua pesquisa. Ela vasculha nichos da nossa história religiosa e até política, com a curiosidade necessária para quem quer ser historiador. Transcreve documentos, como bulas e decretos e até a constituição da Câmara Municipal de Lavras, nas primeiras décadas de sua história, mostrando as ligações do poder político com o poder religioso. Assim, a leitura desse livro se torna indispensável não só para lavrenses mas para qualquer pessoa que queira conhecer melhor a história eclesiástica do Ceará.


FONTE: Jornal Diário do Nordeste - 03/03/15.


 

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