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Pádua Lima revisitado

Batista de Lima


Antônio de Pádua Lima da Silva nasceu na cidade de Parnaíba, no Piauí, em 23 de janeiro de 1951. Nesse janeiro de 2013, procurei revisitá-lo nas escadarias da memória, transfiguradas daquelas que davam acesso ao interior do vetusto Liceu do Ceará, em que, no dia 13 de dezembro de 1968, sepultamos nossos sonhos de secundaristas, vítimas do tacão do AI-5. Éramos jovens estudantes amedrontados à procura de um espaço para aspirar alguma brisa de liberdade. Foi nesse clima que surgiu a ideia de se criar o Clube dos Poetas Cearenses (CLUPCE).

A fundação da nova agremiação literária se deu em 30 de março de 1969, tendo como sede a Casa de Juvenal Galeno. Os dois mentores principais foram Carneiro Portela, presidente e articulador, e Pádua Lima, secretário e organizador. A Casa de Juvenal Galeno, por esse tempo, era habitada pelo casal Nenzinha Galeno e Oscar Moreira. O principal interesse nosso era além de ter um auditório para nossas reuniões, dispor da Editora Henriqueta Galeno, cuja gráfica ficava nos fundos da casa. Ali, editamos nossas antologias e alguns poetas editaram seus primeiros livros. O Clube dos Poetas deve muito a essa hospitalidade dada pela neta de Juvenal Galeno, Nenzinha.

Além da hospitalidade de que desfrutávamos, havia ali uma biblioteca de invejável acervo, tendo em Pádua Lima um dos principais frequentadores. Pádua era leitor atualizado, além do fato de secretariar nosso grupo, o que o tornou até hoje o possuidor de vasto material do CLUPCE. É por isso que essa reedição de "De punhos erguidos gritaremos a plenos pulmões" e "Na vertente do verso", em um só volume, é material literário de muito valor, pois além dos bons poemas editados, há uma fortuna crítica sobre o Clube dos Poetas e uma galeria dos nomes que participaram das antologias.

Foram cinco antologias editadas sob os auspícios do Clube dos Poetas. A primeira, com o título de "Novos poetas do Ceará" é de 1970 e tem como prefaciador Jáder de Carvalho. A segunda, de 1971, titulou-se de "II Antologia - Os novos poetas do Ceará", com prefácio de Rachel de Queiroz. A terceira, de 1973, tem como título "Poesia Cearense Hoje", e como as duas anteriores, foi produzida na Editora Henriqueta Galeno. A quarta antologia traz o título "Nova poesia cearense", de 1976, com prefácio de Artur Eduardo Benevides e confeccionada pela Gráfica Editorial Cearense.

A quinta e última antologia é "Poesia de agora", editada pela Imprensa Oficial do Ceará, em 1981. De posse desse precioso material, Pádua Lima, hoje advogado residente em São Paulo, elaborou uma galeria com todos os nomes dos autores que participaram dessas coletâneas. Entre esses autores catalogados há os componentes do CLUPCE mas também alguns convidados de importância no nosso contexto literário. Ao todo foram 94 autores publicados nessas cinco antologias. Entre autores consagrados aparecem nomes como: Antônio Girão Barroso, Artur Eduardo Benevides, Carlos D´Alge, Cid Carvalho, Cláudio Martins, Francisco Alves de Andrade, Francisco Carvalho, Horácio Dídimo, Jáder de Carvalho, Alcides Pinto, Barros Pinho, José Valdivino de Carvalho, Otacílio de Azevedo, Otacílio Colares e Sânzio de Azevedo. Esses escritores tiveram a gentileza de ceder seus textos para publicação entre jovens estreantes na literatura.

Esse material memorialístico do Clube dos Poetas é de grande importância e vem ocupando as últimas páginas do livro. A parte inicial do volume traz os poemas de Pádua Lima publicados entre 1968 e 1977. Por corresponderem a um momento político de exceção, esses poemas possuem um forte apelo social. Pádua Lima era militante estudantil de esquerda e não isentou seus poemas de uma mensagem carregada de protesto. Daí ele iniciar seu livro com essa declaração: "É necessária a palavra, mesmo que se aponte à boca/ duas lâminas de facas". As intertextualidades mais presentes remetem à poética reivindicatória de Thiago de Melo. Ele chega a afirmar: "Quisera cantar mais alto/ mas as botas do inimigo/ pisoteiam as palavras/ do meu canto". No poema "Canto para despertar", há um verso em que ele chega a afirmar: "Faz escuro, mas eu canto". Esse verso é título do mais festejado livro do poeta amazonense. Outra intertextualidade nos remete a Drummond a partir do título de um poema: "Stop! - A minha vida não parou só foi o automóvel". Há também influências de Neruda, Lorca e Maiakovski. Naqueles tempos eram essas as nossas leituras eletivas. Era importante em primeiro lugar ter boas leituras, até teorias como "O arco e a lira", de Octávio Paz.

Outro aspecto que chama a atenção em Pádua Lima está relacionado com suas incursões pela metapoesia. Há momentos em que o poema se confessa para o leitor. Ele se revela não apenas como forma mas principalmente como mensagem. Esse exercício está mais presente no livro "Na vertente do verso", principalmente nos poemas "És a estrutura do meu verso..." e "Por uma poesia substantiva". No primeiro, ele afirma: "És a estrutura de meu verso:/ um corpo em movimento;/ uma palavra ausente". No segundo, está escrito que "é indispensável ao poema/ o verso explícito e poeticamente comprometido/ com a palavra - este código vocabular da alma". Outros momentos do livro apresentam essa vertente poética, já que o poeta dá voz ao poema para falar de si próprio.

Essa revisita a Pádua Lima inclui contato com outros colegas do Clube dos Poetas: Carneiro Portela, Márcio Catunda, Aírton Monte, Renato Saldanha, Gerim Cavalcante, Rosemberg Cariri, Mário Gomes, Rembrandt de Matos Esmeraldo, Josênio Parente e outros tantos reunidos em um sábado por mês para falar de poesia. É um retorno ao natal dos poetas que fazíamos anualmente, ao festival de poesias que realizávamos. Muitos daqueles jovens, alguns ainda imberbes à época, estão hoje destacados nas artes e no mercado de trabalho. O mais importante, no entanto, é esse contato com a voz de Pádua Lima impressa nesses poemas, todos carregados de força poética, metáforas gritantes e uma imensa ternura transbordando dos seus versos.


FONTE: Jornal Diário do Nordeste - 19/02/13.


 

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