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Os coronéis de Ciro Saraiva


Batista de Lima


No tempo dos coronéis", de J. Ciro Saraiva, é uma obra cronologicamente desarrumada. Não há uma sequência de tempo definida que possa ser seguida pelo leitor. Isso não tira o mérito da obra. Afinal, compete ao leitor fazer sua arrumação predileta. Dos três coronéis governadores, entre 1958 e 1986, ele mostra certa predileção por Virgílio Távora, mostrando que o mesmo foi um bom governante. Entretanto sua ênfase, nesse livro, cai sobre Manuel de Castro e Gonzaga Mota, de quem foi secretário.

Ciro Saraiva foi secretário desses dois governos. É por isso que grande parte do livro trata dos bastidores do governo de Manoel de Castro, com suas tiradas inusitadas, além de explicações para a contratação dos 15.000 funcionários para aumento da folha estadual. Secretário, também, de Gonzaga Mota, fica muito bem colocada uma entrevista com esse governador, em que fatos marcantes são esclarecidos entre o rompimento com os coronéis e a adesão à candidatura de Tasso Jereissati.

Ciro Saraiva ingressou no jornalismo por uma porta pela qual tradicionalmente os grandes nomes da imprensa haviam entrado, a revisão. Muito novo empregou-se no jornal "O Estado", como revisor, mas também com a função de cobrir acontecimentos da Câmara de Vereadores. Sua escola foi a companhia dos melhores mestres do jornalismo da época, início da década de 1950. Naquele momento passou a conviver com Durval Aires, Francisco Alves Maia, Roberto Antunes e Daniel Carneiro Job, quando na revisão, e com Agamenon da Frota Leitão, Gutemberg Braun e Antônio Azim, na Câmara de Vereadores.

Essa experiência de Ciro Saraiva faz com que cheguem ao leitor informações variadas sobre a época em que se contextualiza. Muita gente não sabe que o jornal "O Estado" teve um certo tempo, como proprietário, o Cláudio Martins que passou a direção para o escritor Dr. Fran Martins. Também, que no governo Parsifal Barroso essa direção esteve a cargo de Themístocles de Castro e Silva, passando depois para Wenelouis Xavier Pereira, cuja família o mantém em circulação até hoje. Esse momento antecede seu ingresso nos "Diários Associados" para desembocar na sua participação na nascente "Dragão do Mar".

Essa rádio, que funcionou primeiramente na Avenida do Imperador, foi palco de ataques e prisões por parte de repressores a serviço do golpe militar de 1964. O autor lembra perfeitamente que no dia 31 de março de 1964, quatro carros GMC, do Exército, tomaram posição em frente ao prédio da rádio, começando naquele momento, uma saga de perseguições políticas que culminariam com a cassação de mandatos de políticos e prisões arbitrárias de defensores do presidente João Goulart. A emissora chegou a ser fechada e seus transmissores lacrados. A reabertura da rádio ficou condicionada à entrega de sua administração a alguém de confiança da esfera militar. Como amigo de Moisés Pimentel, entra em cena o general Almir Macedo de Mesquita.

O general Almir Macedo de Mesquita recebe tratamento tão especial, pelo autor, que passa a ser admirado por quem o conheceu apenas nas páginas do livro. Um capítulo lhe é dedicado, com o título "O General da Dragão". Apesar de ter sido exigência dos militares, o seu ingresso na Rádio, foi profícua sua administração. "A farda e o microfone" é outro capítulo que trata do caso Dragão do Mar. Em todos esses momentos, Ciro Saraiva estava presente.

Ciro Saraiva acompanhou todos os acontecimentos ocorridos a partir de 31 de março de 1964, que culminaram com cassações de mandatos de cearenses. Na Câmara Municipal de Fortaleza são cassados, os vereadores: Luciano Barreira, Tarcísio Leitão e Manuel Aguiar de Arruda. Na Assembleia Legislativa, perdem seus mandatos, por cassação, os deputados estaduais: Pontes Neto, Raimundo Ivan Barroso de Oliveira, Blanchard Girão, Fiúza Gomes, Aníbal Bonavides e Amadeu Arrais. A Assembleia cearense torna-se assim, a primeira no Brasil a cassar deputados (10.04.1964). No mesmo período, deputados federais cearenses são cassados pela Revolução: Adahil Barreto Cavalcante, José Palhano de Sabóia, Expedito Machado, Padre Antônio Vieira e José Martins Rodrigues.

Finalmente, depois de percorrer as 316 páginas desse livro de Ciro Saraiva, o leitor conclui que a história recente da política cearense é repleta de episódios que necessitam de registro. A riqueza de episódios que compõem nosso panorama político não pode ficar olvidada das novas gerações. Afinal, para entender o presente, necessário se faz esse retorno ao passado. Por isso que o autor presta uma significativa contribuição à nossa memória, provando que o ingrediente imprescindível para a documentação histórica de um povo ainda é a palavra escrita.


FONTE: Jornal Diário do Nordeste - 31/12/13.


 

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