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O Policarpo da Padaria

Batista de Lima




Policarpo Estouro era o criptônimo de Álvaro Martins, quando participou da Padaria Espiritual. Nascido em Trairi, em 4 de abril de 1868, e falecido em Fortaleza em 30 de junho de 1906, Alvarins, como também se assinava, deixou seu nome na Literatura Cearense, e como patrono da cadeira número dois da Academia Cearense de Letras. Apesar de ter vivido apenas 38 anos, deixou publicados os livros: "Os pescadores da Taíba", 1895; "Capela Milagrosa", 1898; "Agonia Suprema", 1901; e "Casa mal assombrada", 1903. Produziu para o teatro: "Belecho" e "Lopes Veiga e Cia".

A Padaria Espiritual, grêmio literário para rapazes de letras e artes, foi fundada em 30 de maio de 1892. Seu mentor principal foi Antônio Sales e dele foi a elaboração do regimento da entidade, composto por 43 itens. Começou a funcionar com vinte membros, entre os quais estava Álvaro Martins. Como cada padeiro precisava ter um "nome de guerra", Álvaro escolheu Policarpo Estouro. Logo em 1894, nosso Policarpo foi expulso da Padaria, juntamente com Temístocles Machado. Os dois, com novos companheiros literatos, vieram a fundar naquele ano, o Centro Literário.

Já em 1895 embarca para o Rio de Janeiro onde colaborou nos jornais "Cidade do Rio" e "Gazeta Nacional", mantendo sempre suas ideias republicanas e abolicionistas.

No Centro Literário, Álvaro Martins passou a conviver literariamente com escritores expressivos da época. Segundo Sânzio de Azevedo, foi um grupo que se destacou pela qualidade de sua produção e pela quantidade de seus membros. Composto inicialmente de 26 componentes, entre eles se destacava Álvaro Martins.

Também ali estavam Juvenal Galeno, Temístocles Machado, Pápi Júnior, Pedro Moniz, Rodolfo Teófilo, Jovino Guedes, Quintino Cunha e Farias Brito, entre outros. Essa agremiação ficou em atividade durante dez anos e chegou a editar a revista Iracema. Com o tempo, 1895, esse grêmio literário contava com tantos membros que foi preciso reduzir seus sócios para os trinta mais atuantes.

O livro de Álvaro Martins, que teve maior repercussão foi "Os pescadores da Taíba". É um longo poema editado em 1895 e publicado em edição fac-símile em 2005, numa parceria da Biblioteca O Curumim Sem Nome, de Fortaleza, com a Oficina do Livro Rubens Borba de Moraes, de São Paulo. A primeira edição havia sido produzida pela Tipografia Universal, de Cunha Ferro e Cia, de Fortaleza, e restavam pouquíssimos exemplares em mãos de cuidadosos colecionadores. Daí que, segundo Jorge Brito, em texto nessa nova edição, "O exemplar que serve de base para esta edição fac-similar faz parte do acervo do Arquivo Público Estadual Jordão Emerenciano, de Recife, Pernambuco".

Essa edição fac-similar traz a Introdução assinada por Sânzio de Azevedo que faz uma análise criteriosa do poema, além de comentar a repercussão do livro entre os críticos da época. Já a Apresentação ficou a cargo de Jorge Brito que apresenta as dificuldades de encontrar exemplar da primeira edição para a reprodução dessa segunda. Quanto às aquarelas que ilustram essa nova edição, louve-se a performance criativa de Côca Torquato que esmerou-se como ilustradora da obra. Antes porém de iniciar o texto original, o leitor encontra belo poema de Virgílio Maia intitulado "Sete momentos do Mar da Tahyba".

Álvaro Martins, ao publicar esse seu livro, em 1895, transcreveu de seu amigo e colega do Centro Literário, Pedro Moniz, uma carta contendo análise do livro. Esse texto foi tão bem escrito que Alvarins o editou em seu livro à guisa de prefácio. No texto, Moniz acentua o lado romântico do poema de Álvaro, enfatizando a tragédia que abateu Zé-do-Mar, tragado pelo mar profundo, no seu ofício de pescador, deixando viúva a noiva Xiquita. Como panorama para esse caso de amor, o missivista enaltece o lado romântico do pequeno povoado da Taíba, com seus habitantes sonhando ao som da viola de Zé-do-Mar, o canto das gaivotas e o barulho do mar em maré cheia.

Álvaro Martins, apesar de quase esquecido, e de ter tido vida efêmera, foi atuante no mundo literário de seu tempo. Chegou a colaborar com suas criações na revista "A Quinzena" que foi órgão divulgador dos componentes do Clube Literário. Atribui-se a esse grupo, o início do Realismo no Ceará. Dele fizeram parte, além de Antônio Martins, seu irmão e poeta abolicionista, figuras como Oliveira Paiva e Rodolfo Teófilo. Também colaborou com destaque no jornal "Libertador", sempre usando o pseudônimo de Alvarins. Não se pode esquecer que ao tempo em que militava na Padaria Espiritual teve destacada participação no jornal "O Pão".

Prestes a ter seu cesquicentenário de nascimento completado, 2018, Álvaro Martins só teve até agora reeditada essa sua obra, "Os pescadores da Taíba", e em edição fac-similar. Pelo que se sabe não há outra referência a sua personalidade, além de ser patrono da Cadeira número dois da Academia Cearense de Letras. Não há logradouro, instituição ou pesquisa sobre sua obra. Essa dívida está em aberto na sua terra natal, Trairi, em Fortaleza, em que teve maior atuação como escritor, e onde terminou seus dias, e no Rio de Janeiro onde militou no jornalismo com destaque. Que essa reedição de "Os pescadores de Taíba" seja um marco para que se resgate e se analise o espólio literário desse esquecido escritor cearense.


FONTE: Jornal Diário do Nordeste - 01/07/2017.


 

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