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O mar de Moacir

Batista de Lima




Há três escritores cearenses que se destacam pela temática ligada ao mar. Os três serviram na Marinha. Adolfo Caminha, com "Bom crioulo", Ednilo Soares, com "Náufragos do Porto" e Moacir Lopes, com a maioria dos seus vinte livros formam esse trio construtor de uma literatura embarcada. É uma literatura com sabor de maresia mas que mostra também o dissabor da vida do mar e os percalços das grandes rotas. Dos três é preciso que se destaque a figura de Moacir Lopes, que dado o seu volume de escritos com temática marítima, está a merecer mais estudos sobre sua obra.

O maior sucesso entre as vinte obras de Moacir Lopes foi o de "A ostra e o vento". Foi, inclusive, tornada filme com roteiro e direção de Válter Lima Júnior. Traz uma característica muito presente nos outros livros do autor que é a solidão. O mar, com sua imensidão e seu barulho cadenciado, cria uma suspensão do ser ao ser desprendido do chão. O autor captou nuances da convivência homem/mar que só quem passou pelo que ele vivenciou pode dimensionar a influência do mar nas pessoas.

Louva-se portanto a iniciativa da potiguar Susana Frutuoso, em vir estudar esse autor cearense. Nos seus estudos de Mestrado em Literatura, ela, munida da curiosidade dos pesquisadores, debruçou-se sobre vida e obra de Moacir Lopes, enriquecendo a fortuna crítica desse autor cearense tão desconhecido no Ceará. Entrevistou o autor e muitos de seus familiares, utilizou-se de seus livros como fonte complementar da pesquisa e escreveu esse livro, resgatando para a nossa literatura, esse que é um dos melhores escritores do Ceará.

Pela pesquisa de Susana conhece-se toda a trajetória de vida de Moacir Lopes, desde sua infância difícil em Quixadá, onde nasceu em 1927, até sua morte no Rio de Janeiro em 2010. Desde o seu primeiro romance, "Maria de cada porto", de 1959, entre os nove que escreveu, o mar é o cenário principal. Moacir foi um autêntico homem do mar, ao cruzar os oceanos, na sua função de marinheiro. Tinha ele uma atração profunda pelos oceanos, pela imensidão que a vista alcançava até vislumbrar no horizonte o céu e a água se tocando em diálogo da natureza.

Susana Frutuoso aproveitou o percurso por terra desse marinheiro e foi no seu encalço, traçando seus caminhos, suas venturas, aventuras e desventuras. Venturas, por deixar um patrimônio de duas dezenas de livros de boa literatura, aplaudido e lido nacionalmente, e traduzido no exterior. E é porque seu primeiro livro só foi publicado quando ele já estava com 32 anos de idade. As aventuras ficam por conta da vida no mar, principalmente para quem foi marinheiro durante a Segunda Guerra Mundial. Também a sua permanência sob a tutela de um tio rude e sua esposa insensível. As desventuras por perder dois filhos ainda jovens, uma moça que caiu de um edifício e um rapaz que morreu de leucemia.

A sua trajetória, que começa em Quixadá, passa por Fortaleza, onde ingressa na Escola de Aprendizes Marinheiros. Depois vai para o Rio de Janeiro onde fica até à morte. Foi na cidade maravilhosa em que ele projetou-se como escritor. Ganhou prêmios, foi também professor universitário e fundou a Editora Cátedra, em que editou muitos escritores iniciantes. Além disso deixou inédito seu livro de memórias em que retorna nostalgicamente à Quixadá da sua infância.

A autora dessa biografia de Moacir Lopes, Susana Frutuoso, passou a ter contato com seu biografado a partir do curso de Mestrado em Literatura Brasileira que desenvolveu na Universidade Federal do Ceará. Foi a partir daí que recebeu convite das Edições Demócrito Rocha para a confecção desse livro, que com suas oitenta páginas, consegue resgatar Moacir Lopes de um ostracismo a que vinha sendo submetido logo em sua terra natal, o Ceará. Para a realização desse projeto, Susana Frutuoso teve vários contatos com Moacir e dele extraiu muitas revelações até então desconhecidas do grande público.

Por fim pode-se colocar Moacir Lopes entre os três principais escritores que mais honraram as ligações biográficas com a cidade cearense de Quixadá. Além dele, Rachel de Queiroz e Jáder de Carvalho. É tanto que além de nascido naquela cidade, Moacir nas suas memórias inéditas, descreve a terra de suas origens, o folclore da região, seus folguedos e sua meninice. Quixadá é pintada como um paraíso perdido na distância do tempo, mas latente na memória. Por isso é por demais importante a edição desse memorial do autor de "Cais, saudade em pedra", como forma de trazê-lo de volta, oficialmente, à terra que o viu nascer e que ele tanto honra nos seus últimos escritos.


FONTE: Diário do Nordeste - 13/06/2017.


 

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