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O lirismo de Giselda Medeiros

Batista de Lima



A produção literária proveniente de uma saga geralmente resulta em um romance, quando prosa, ou em uma epopeia, quando verso. É difícil, pois, uma saga lírica, mas não impossível. Há, por exemplo, no "Dom Quixote", muito lirismo, enquanto ali se desenvolve uma saga do Cavaleiro da Triste Figura.

No "Grande Sertão: Veredas", Guimarães Rosa, ao tratar da relação entre Riobaldo e Diadorim, tempera a narrativa com recursos do mais puro lirismo. A todo momento os dois personagens se atraem e ao mesmo tempo se retêm na bonita atração que é um crescente em toda a narrativa.

No caso de "A Saga Lírica de Giselda Medeiros", organizado por Gizela Nunes da Costa, a primeira preocupação do leitor é descobrir em que momento o lirismo e a saga se imbricam. O livro é de resenhas sobre seus livros publicados e premiados ao longo de sua trajetória literária. Seu gênero literário característico é a poesia. É uma poesia que ao longo dos anos vem crescendo em qualidade. Daí que a crítica cada vez mais acentua essas qualidades literárias, e sua vocação de promoter da literatura que se faz no Ceará. Giselda tem liderado instituições literárias que vicejam entre nós.

Voltando-se à questão da saga, pode-se atribuí-la à luta da escritora no seu momento de criação. Afinal, a criação artística é um parto, muitas vezes dorido. O ato criativo é uma luta para prospectar da estrutura profunda do ser o que por lá pulsa de subjetividades.

Essa luta arqueológica em busca das nossas preciosidades particulares não deixa de ser uma saga. E como se torna uma manifestação do eu lírico, há um casamento da emoção com a razão, tendo em vista que depois de tudo isso vem o burilamento do material extraído da nossa fala particular.

Atentos a esse fenômeno criativo, alguns escritores se debruçaram sobre a produção literária de Giselda Medeiros e produziram resenhas e artigos de análise da sua arte. Louve-se então, em primeiro lugar, a garimpagem efetivada por Gizela Nunes da Costa, que organizou a coletânea dos textos, incluindo entrevistas e discursos produzidos por ou para Giselda. Todo esse material, meticulosamente preparado pela organizadora, vai aparecendo em ordem alfabética, por autor, o que já exibe de entrada duas belas resenhas de Artur Eduardo Benevides. São textos em torno de "Alma liberta", de 1986 e de "Cantos circunstanciais", de 1996.

A partir das análises de Artur Eduardo Benevides, vão surgindo conclusões em torno das intertextualidades na obra de Giselda Medeiros. Sua poética tem tomado feições que oscilam entre formas fixas de elaboração poemática e produções em versos livres. É nesse transitar entre as duas formas que fica bem patenteada sua influência oriunda das leituras em torno da produção do mestre Artur, artífice maior entre nós, representativo da Geração de 45. Para essa constatação é bom que se leiam "Ânfora de Sol" e "Sob Eros e Thanatos". E a partir daí navegar pelas resenhas de Linhares Filho e Maria do Carmo Fontenele.

Giselda Medeiros, ao ingressar na Academia Cearense de Letras, foi saudada pela escritora Regine Limaverde, através de discurso antológico que ficou marcado nos anais daquele sodalício. Na mesma ocasião, Giselda pronunciou seus agradecimentos através de um pronunciamento marcado pela grandiloquência que a ocasião solenemente exigia. Essas duas peças do mais alto lavor literário compõem a abertura desse livro em sua homenagem. Para coroar de pompa esse seu ingresso na ACL, a escritora Geraldina Amaral a entrevistou para a Revista Jangada. Conseguindo da nova imortal um périplo memorial, unindo a escritora à professora Giselda Medeiros.

Nesse transcurso pelos textos críticos sobre a obra de Giselda Medeiros, três escritores de saudosa memória também deixaram suas apreciações sobre tão profícua obra. Primeiro seu professor, e de todos nós, o acadêmico José Alves Fernandes, que focaliza exatamente na "leveza mágica do estilo poético" da homenageada. Depois, José Teles, com sua perspicácia de garimpador literário, se debruça sobre "Ânfora de Sol" e enumera metáforas como filigranas da arte de sonhar sem esquecer a técnica de composição textual da autora. O terceiro, não mais entre nós, Nilto Maciel, dispensa especial tratamento em torno do tempo transfigurado nas narrativas de "Sob Eros e Thanatos".

Finalmente constata-se que muitos são os críticos que fizeram suas leituras da obra de Giselda e que vão desfilando no livro, enriquecendo-o com suas resenhas. Vão assim aparecendo Carlos Augusto Viana, Débora Cavalcante, Dimas Macedo, Elinalva de Oliveira, Evan Bessa, Francisco Nobre, Genuino Sales, Argentina Austregésilo, Maria do Carmo Fontenele, Maria Helena do Amaral Macedo, Maria Luísa Bonfim, Nirvana Medeiros, Neide Azevedo, Rejane Costa Barros, Rosa Virgínia Carneiro e Zenaide Marçal.

Ao final ainda aparecem diversos escritores que em curtos depoimentos sinalizam para o legado literário de Giselda. Assim fica completado esse seu apanhado crítico das mais variadas feições, o que faz com que a leitura do livro se torne agradável, à luz de uma saga, através de sua trajetória lírica pelos meandros da criação literária.


FONTE: Jornal Diário do Nordeste - 18/07/2017.


 

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