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O grupo Siriará de literatura

Batista de Lima



Os trinta anos do surgimento do grupo Siriará de literatura nos colocam diante da necessidade de melhor estudá-lo para entender aquele momento da história cultural cearense. Primeiramente verifica-se ser esse o último grande grupo literário do Ceará, marcado pela organização, pela qualidade dos seus componentes e pela importância do seu manifesto. É tanto que, ao lado da Padaria Espiritual, constitui dois grupos literários cearenses caracterizados pela elaboração de marcantes manifestos. O da Padaria, com sua verve jocosa; o do Siriará, com sua atmosfera de protesto. Esse protesto que transparece no Manifesto Siriará reflete o momento de incerteza em que ainda vivíamos, já que tentávamos extirpar do nosso dia-a-dia os últimos resquícios do quisto produzido pelos anos de chumbo que se instalaram no Brasil desde 1964. Daí se falar em ´democracia relativa´, como se o estado democrático de uma nação permitisse exceções para o cidadão no seu livre arbítrio. Naquele momento, a abertura política era tão lenta e tão gradual que nosso ímpeto de jovens não acreditava por completo no seu sucesso. Também verberávamos contra o colonialismo cultural que nos impunha o ´eixão-maravilha´ (Rio e São Paulo). Éramos ´a favor de uma literatura sem vassalagem´. O Manifesto Siriará teve a sua redação inicial a cargo de Carlos Emílio Correia Lima, Adriano Espínola e Jackson Sampaio. A aprovação, posteriormente, deu-se em assembléia geral de todos os membros e posterior assinatura dos presentes. Vinte e dois escritores assinaram o Manifesto com seus nomes aparecendo em ordem alfabética. As reuniões do grupo aconteciam nos locais os mais inusitados. Eram encontros na sala de terapia de grupo do hospital Mira e Lopes, no Estoril, na casa da Fernanda Gurgel do Amaral e do Geraldo Markan. O Estoril era o local onde mais nos reuníamos. Também promovemos eventos como a participação com banca de produtos do grupo na reunião da SBPC, no campus da UFC, no Pici. A chuva de poesia, no centro de Fortaleza, numa manhã de sábado, teve repercussão nacional. Também o lançamento do livro Fala favela, de Adriano Espínola, chamou a atenção por ter sido lançado do alto do prédio da Sulamérica, na Praça do Ferreira, em ensolarada manhã. Esse livro, um poema épico sobre episódio de invasão de sem tetos a um terreno da avenida José Bastos, teve seu texto encenado pelo Grupo Crita, no Teatro Universitário, com apreciável sucesso. O que ficou de mais significante para o grupo foi sua memória, agora retomada aos trinta anos e sua produção literária. A Editora Moderna editou alguns livros de escritores do Grupo como O grande pânico, de Aírton Monte; O cabeça de cuia, de Paulo Veras, e A cachoeira das eras, de Carlos Emílio Correia Lima. O ponto culminante do movimento foi, no entanto, quando unidos os 22 componentes, discutimos, modificamos, aprovamos e assinamos o Manifesto Siriará. O documento traz a assinatura de Adriano Espínola , Airton Monte, Antônio Rodrigues de Sousa, Batista de Lima, Carlos Emílio Correia Lima, Eugênio Leandro, Fernando Teixeira Gurgel do Amaral, Floriano Martins, Geraldo Markan Ferreira, Jackson Sampaio, Joyce Cavalcante, Lydia Teles, Márcio Catunda, Maryse Sales Silveira, Marly Vasconcelos, Natalício Barroso Filho, Nilto Maciel, Nírton Venâncio, Oswald Barroso, Paulo Barbosa, Paulo Veras, Rogaciano Leite Filho, Rosemberg Cariri e Sílvio Barreira. A data da assinatura do Manifesto foi 14 de julho de 1979. Seu texto foi impresso em apenas uma lauda e distribuído para a população, mas principalmente na SBPC. É um texto de mensagem forte em que o grupo declara ser ´a favor de um texto terra (conteúdo); de um texto mestiço (forma); de um texto Siriará (intenção e linguagem)´. Aproveita ainda o documento para protestar ´contra modelos e formas de pensar e escrever importados, impostos - postagem alienante da culturália tupiniquim mal pensante´. Ao final, patenteávamos nossa ojeriza ´a toda forma de opressão, de repressão política e/ou cultural´, pois estávamos juntos para, unindo forças, lutarmos por ´uma literatura de combate, de questionamento, de indagação´. Todas essas bandeiras chamaram a atenção dos intelectuais da época que conseqüentemente abriram alguns espaços para a divulgação de nossos trabalhos. Até a Prefeitura de Fortaleza promoveu o nosso movimento ao editar a revista SIRIARÁ, ano 1 -nº 1 - de julho de 1979. Logo na abertura da revista está escrito: ´Por uma atenção toda especial, agradecemos ao Exmo. Sr. Dr. Lúcio Gonçalo de Alcântara, Prefeito Municipal de Fortaleza, pelo apoio que nos deu através da Imprensa Oficial do Município, onde foi impressa nossa revista. A revista traz textos de componentes do grupo mas também de colaboradores de fora dele. É o caso de Caetano Ximenes Aragão, Afrânio Barroso de Melo, Geraldo Urano, Ricardo Alcântara, Antônio José Soares Brandão, Ivan Alencar e B.C. Neto. O projeto gráfico é de Caú, Sílvio Barreira e Rosemberg Cariri. É um projeto ousado que traz os textos enriquecidos com desenhos e ilustrações de Tarcísio Garcia, Walderedo Gonçalves, Flávio Américo, Paulo Barbosa, Alano, Ivan Alencar, Itamar do Mar, Macaco, Rosemberg Cariri, Albrancor, Zenon Barreto, Rodolfo Marcan, Sérvulo Esmeraldo, Marcus Jussier, Estrigas, Bené Fonteles, Caú e Ricardo Augusto. Essa revista e o manifesto, além dos livros que o grupo editou na época, são os documentos mais confiáveis para que se estude o Siriará. Há, no entanto, outras fontes que podem ser consultadas. Uma delas é o acervo fotográfico de Luizinho. Onde íamos, lá estava o fotógrafo registrando todos os eventos que promovíamos. Outra fonte é a memória de cada componente do grupo. Cada um tem seus momentos a contar. E agora, após trinta anos, pode-se verificar que o Grupo Siriará existiu e funcionou bem no tempo certo. Acabou-se porque não resistimos à autocrítica que promovemos, porque o ecletismo do grupo não permitia, com o passar do tempo, uma convivência harmoniosa, e porque cada grupo se enraíza num momento histórico adubado pelos aconteceres do dia-a-dia. O momento do Siriará era aquele, apenas aquele.

 

22/04/2008.

 

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