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Nascimento do Siriará

Batista de Lima


O nascimento do Grupo Siriará de Literatura se deu no dia 08 de abril de 1979, no sítio da jornalista Jô Abreu, no Eusébio, hoje município da Região Metropolitana de Fortaleza. Estavam presentes os escritores Aírton Monte, Márcio Catunda, Oswald Barroso e Rogaciano Leite Filho. Naquele momento se realizou ali a primeira reunião do Grupo, conforme consta na ata elaborada na ocasião, e que, estando em poder do escritor Adriano Espínola, no Rio de Janeiro, foi-me passada no original. Não consta quem secretariou a reunião, chegando a elaborar o documento inicial, o que só pode ser confirmado por Márcio Catunda ou Oswald Barroso, tendo em vista que já faleceram Aírton Monte e Rogaciano Leite Filho.

Os pontos discutidos giraram em torno da movimentação, naquele momento, dos novos escritores cearenses. Para isso foram analisadas as colaborações desses escritores, nos jornais, bem como a ideia de uma maior movimentação literária no Ceará. Como na época havia uma grande produção literária entre os escritores mineiros, traçou-se um paralelo com a realidade local. Daí que dois problemas foram ventilados como responsáveis pelo marasmo da literatura cearense naquele momento: o individualismo e a marginalização dos nossos escritores. Como esse movimento de reação estava surgindo, a questão era saber como ampliá-lo. Como fazer para o escritor retratar a realidade social, se a maioria dos novos vivia a cultivar a poesia, que tinha no seio da população uma imagem depreciativa e às vezes até pejorativa. Depois questionou-se o papel do Clube dos Poetas Cearenses, um tanto conservador, ali representado por Márcio Catunda.

Naquela primeira reunião, um dos pontos mais discutidos foi a relação da literatura com os órgãos de comunicação de massa. Também verificou-se que a incipiente crítica literária cearense não dava conta do que por aqui se publicava. Se bem que essas publicações contemplavam apenas os medalhões da literatura, principalmente aqueles vinculados ao já enfraquecido Grupo Clã, à Academia Cearense de Letras e aos quadros docentes da UFC. Era necessária a publicação de antologias e a edição de livros dos jovens autores. Isso carecia da formação de um grupo que se movimentaria através de debates e recitais como forma de integrá-lo na literatura cearense. Era preciso dar um nome a esse movimento.

Após a discussão desses pontos surgiram várias sugestões. Uma delas foi aproveitar a realização da SBPC, que viria a se realizar na UFC, em julho daquele ano, para o novo Grupo mostrar sua cara através da ocupação de alguns espaços que lhe fossem disponibilizados. Também seria organizada uma programação no Curso de Letras da UFC, além da promoção de show literário na Praça do Ferreira. Não se descartou a possibilidade de se promoverem concursos literários anuais com prêmios substanciais. Ficou acertado por fim que o grupo se ampliaria e que reuniões regulares seriam realizadas para a efetivação das propostas aprovadas.

A segunda reunião do Siriará se realizou no dia 14 de abril de 1979. Conforme consta na ata dessa reunião, estavam presentes Adriano Espínola, Batista de Lima, Floriano Martins e Rogaciano Leite Filho. Alguns detalhes chamam a atenção: da primeira reunião só o Rogaciano participou da segunda, o que significa seu interesse e sua liderança no grupo. Depois, eu já fiz parte dessa reunião. Lembro-me que o convite partiu do Adriano, pelo fato de sermos colegas como professores na Universidade de Fortaleza, e em já ter publicado meu livro "Miranças", em 1977 e ter pertencido ao Clube dos Poetas Cearenses. Aliás, naquele tempo estavam lecionando na Unifor, além de nós dois, os escritores: Horário Dídimo, Pedro Paulo Montenegro, Dias da Silva, Costa Matos, Carlos d´Alge, Pedro Lira e Roberto Pontes. Mas voltando à reunião é bom que se diga que novos pontos foram discutidos além dos tratados no primeiro encontro.

Naquele momento discutiu-se a possibilidade de se aprofundarem os laços afetivos do Grupo, como forma de se chegar a uma efetividade. Depois verificamos a necessidade de se conhecer a historicidade literária do Ceará. Para isso iríamos lutar pela efetivação do Projeto de Ativação Literária do Curso de Letras da UFC, para se chegar ao "Iº Ciclo de Debates sobre Literatura Cearense". Nessa luta, que saiu vitoriosa, foi importante a participação de Adriano Espínola que já era professor também daquela instituição, tendo contado com a ajuda significativa de Moreira Campos. Além desses, outros pontos discutidos já haviam sido tratados na primeira reunião. Acontece que na ocasião já surgiu uma preocupação com a necessidade de avaliar a nossa linguagem pequeno-burquesa nos moldes de grupos literários anteriores. Também concluiu-se que era preciso um órgão literário divulgador das produções do Grupo. Não se descartou a necessidade de um debate com membros dos Grupos CLÃ e SIN.

Depois de ampla discussão, patentearam-se alguns encaminhamentos. O mais urgente que considerávamos naquele momento era a edição de um periódico literário exclusivo do Grupo, mas com a participação aberta a trabalhos de qualidade de autores outros. Ao final constatou-se que para as nossas pretensões formais e conteudísticas era preciso encontrar respostas para as seguintes perguntas: "O que é literatura para nós? O que nos propomos a fazer? O que podemos criar em cima daquilo que já foi criado? O nosso movimento pretende inovar a literatura, modificar, revolucionar alguma coisa?"

Essa segunda reunião, mesmo constando em ata, não deixa claro onde foi realizada. Também mais uma vez não consta quem escreveu o texto. O que já estava mais ou menos cristalizado era a liderança de Rogaciano Leite Filho. Sei bem que ao longo do movimento fizemos reuniões nos mais variados espaços. Como possuíamos psiquiatras no Grupo, Aírton Monte e Jackson Sampaio, tivemos reuniões na sala de terapia de grupo no hospital Myra e Lopes. Ali realizamos algumas reuniões. Fizemos uma reunião na residência de Eusélio Oliveira; outra, na casa de Geraldo Markan e uma ou duas no apartamento de Rogaciano Leite Filho. Houve uma memorável reunião na casa de Fernanda Gurgel do Amaral, da qual não participei. No entanto estive presente em reuniões que ocorreram no Estoril. Geralmente eram aos sábados à noite e regadas ao que a casa oferecia de opções, com a possibilidade de podermos pendurar a conta para pagamento ao final do mês.

Essas reuniões eram acaloradas, com discussões acirradas pois o Grupo Siriará, arregimentando mais de duas dezenas de escritores para as suas hostes, não havia se preocupado com o perfil ideológico desses participantes. Daí que conviviam nos mesmos debates, escritores, ex-presos políticos como Oswald Barroso e participantes sem linha política definida. Era difícil pois manter uma linha de discussão em que não houvesse discordância de uma das partes.

Após essas duas primeiras reuniões com suas devidas atas, outras de menor porte se realizaram mas que só a sexta e a sétima nos chegaram com seus registros. O grupo numericamente cresceu e as atividades foram surgindo. Houve a edição da "Revista Siriará", que circulou apenas em um número, elaborou-se o "Manifesto Siriará" que foi distribuído na SBPC, o recital "Essa história de Poesia", a publicação de livros de autores do Grupo pela Editora Moderna e posteriormente a "Chuva de Poesia". Todos esses eventos que trarei à baila posteriormente, tornaram o Siririará um dos mais efetivos grupos literários do Ceará.


FONTE: Jornal Diário do Nordeste - 23/04/13.


 

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