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Literatura no Ceará

Batista de Lima



Um dos principais problemas enfrentados por quem faz literatura no Ceará é a falta de uma crítica à altura da produção literária. Não se tem uma avaliação do que aqui se produz. Daí que ao aparecer alguém que se preocupe em analisar a produção literária daqui é meritória novidade. É o que acontece com esse grupo de pesquisadores da área de Letras, ligados à Universidade Federal do Ceará. Eles estudam autores cearenses e preparam ensaios críticos sobre os mesmos, sem esquecer as normas das produções científicas. Depois disso publicam pela Expressão Gráfica Editora como acontece agora com esse quarto volume de suas pesquisas.

Esse quarto livro do grupo traz como título "Literatura no Ceará: Diálogos Interdisciplinares". São 287 páginas em que se alinham 21 ensaios exclusivamente sobre livros e autores que militam nas letras cearenses. Os organizadores, que também figuram como analistas, são: Alexandre Vidal de Souza, que analisa a participação de Jáder de Carvalho em "O canto novo da raça"; Fernanda Diniz, com um olhar sobre a religiosidade poética de Horácio Dídimo; Fernângela Diniz, com o momento realista de Adolfo Caminha, em "Tentação"; Gildênia Moura, com o memorialismo de Gustavo Barroso. Só os textos analíticos desses quatro autores organizadores já justificam a leitura do livro inteiro.

O prefácio é de Marilde Alves da Silva, que também, no corpo do livro, apresenta análise sobre o viés pictório da arte literária de Leite Júnior. É entretanto ao prefaciar o livro que ela passeia prospectando em cada um dos analistas suas descobertas dos autores estudados. Primeiro ela avisa que o livro versa sobre autores nascidos no Ceará. Depois historia o que foi produzido nos três livros anteriores escritos pelo grupo. Em seguida alerta para o fato de que as análises demonstram que seus autores têm uma predileção pela prosa literária e a poesia. Mesmo assim, ela assevera que o leitor "encontrará textos analisados pela ótica da literatura, da memorialística, da sociologia, da história, da semiótica, da linguística textual e da pesquisa biográfica.

Após o prefácio, o leitor pode iniciar sua leitura pelos ensaios de sua preferência, afinal, como assegura Barthes, o prazer do texto de quem lê crítica é um prazer sobre um prazer do outro. É uma atitude de puro voyeurismo lectural. Afinal o que mais importa é que depois de se sentir voyeur ao ler essas análises, que o leitor vá diretamente aos livros estudados e faça sua leitura. Que esses trabalhos tão bem elaborados pelos seus criadores promovam a leitura dos autores cearenses tão esquecidos pelos leitores do Ceará. Daí que posso confessar que mesmo tendo, em toda a minha docência na Universidade Estadual do Ceará, trabalhado em torno da Literatura Cearense, encontrei nesse livro novidades que não estudei em sala de aula.

A principal delas responde pelo nome de Alba Valdez, personalidade literária única dessa coletânea de ensaios de quem nunca li um texto. Todos os outros levei ao conhecimento dos meus alunos. Entretanto, mesmo sabendo de sua existência, de sua garra nos meios literários cearenses, também me penitencio por essa omissão que agora corrigirei, lendo seus dois livros citados pelas pesquisadoras Avanúzia Ferreira Matias e Larissa Naiara Souza de Almeida. Essas duas autoras instigam o leitor a ler "Em sonho" e "Dias de luz - Recordações da Adolescência", de Alba Valdez, bem como se certificar da trajetória de vida dessa heroína cearense posta no ostracismo.

Mesmo com o gosto pessoal de cada leitor, é importante a leitura do livro inteiro porque cada ensaio traz sua importância particular. Isso se comprova até mesmo quando o mesmo autor chega a ser tema de dois estudos, como é o caso de Patativa do Assaré, primeiramente estudado por Aruska Kelly Carvalho de Oliveira e em outro belo ensaio, por Stélio Torquato Lima. Entretanto caso mais significativo ocorre com o poeta Roberto Pontes que chega a ser contemplado com três ensaios sobre suas obras. Jéssica Thaís Loiola Soares vasculha a sensualidade de seu "Verbo Encarnado"; José William Craveiro Torres vê sua análise sobre Sá - Carneiro e Mary Nascimento da Silva Leitão mergulha em outras reentrâncias de seu "Verbo encarnado".

Esse rastreamento para ficar completo, precisa trazer a lume, para gáudio do leitor, a leitura dos ensaios, também presentes no livro, de: André Luiz dos Santos, em parceria com Wellington Rodrigues; de Cintya Kelly Barroso, com Solange Mendes e ainda da dupla Maria de Jesus Vaz com Regina Rodrigues Araújo. Esses trabalhos em parceria visualizam para uma necessidade premente da análise em equipe para integração de leituras. Outros trabalhos, desta feita, individuais merecem nossos encômios pela sua qualidade. É o que está apresentado por Cássia Alves da Silva, Felipe Fontenele de Oliveira, Gertrudes Costa Sales, Gildênia Moura de Araújo, Lílian Martins de Abreu, Marijara Oliveira da Rocha, Raimundo João Arnold Araújo e Stefanie Cavalcanti de Lima.

Finalmente fica aqui patenteada minha agradável surpresa de encontrar um grupo de estudiosos da Literatura Cearense, adotando um olhar eminentemente crítico, o que nunca ocorrera antes. Depois, a persistência e inquietude de Fernanda Maria Diniz da Silva com sua equipe de colegas. Isso sem contar com os professores orientadores por trás desse belo projeto. Que outros livros apareçam a cada ano para que o leitor se delicie com as descobertas desses leitores privilegiados que rastreiam e prospectam preciosidades da Literatura no Ceará. Que outros escritores ainda não visitados pelas suas curiosidades sejam aquinhoados com essas tão ricas análises pois o escritor cearense precisa saber qual a qualidade da sua produção literária, e vocês, ensaístas, estão no caminho certo.


FONTE: Jornal Diário do Nordeste - 06/09/2016.


 

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