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Inesperada canção de Regine

Batista de Lima


Há pouco tempo Regine Limaverde havia lançado "Eternas Lanternas do Tempo" (2012), uma elegia ao amor ceifado pela indesejada das gentes. Entretanto, fiel à formação de seu nome "Lima" e "Verde", ela que parecia ter murchado, agora rejuvenesce viridente em "Canção do amor inesperado", (2014), da Expressão Gráfica Editora. Mais sensual que "Mar de Sargaços", anterior a esses dois livros citados, desta feita não é apenas erotismo que aparece.

Há nesse seu novo livro um viés político que termina por colocar o erotismo em um segundo plano. A posfaciadora, Vivian Matias dos Santos, alerta para uma prática política que questiona as convenções do "cânone literário". Não é fácil unir política e vadiação numa mesma poética. Isso porque uma vertente, geralmente, esteriliza a outra. Depois, essa prática erotizante tem sido quase sempre de domínio masculino. Nesse livro, Regine Limaverde tem as rédeas da cena do jogo sensual, sendo o parceiro muito mais um figurante.

Esse seu "cântico dos cânticos" quebra, pois, um paradigma tradicional o que faz com que um livro que tinha tudo para não dar certo, por ser mais circunstancial e continuativo do que foi "Mar de Sargaços", dá uma feição nova e exemplar para mulheres que queiram seguir seu exemplo. Primeiro ela dá exemplo de que não há idade certa para o amor, que o coração, enquanto latejar, é quem dá as cartas para o idílio. Depois, que as palavras ainda são a porta aberta para os jogos sensuais. Elas tocam antes dos corpos se tocarem.

Essas palavras têm tanta importância nos jogos eróticos que a certa altura a autora proclama: "Nada me excita mais do que tuas palavras". Essa afirmação recupera o valor da palavra, tão defasado nas relações amorosas dos dias de hoje. Não deixa de ser uma atitude romântica essa prática entre os amantes. A compreensão do outro passa por uma troca de falas. Daí que a comunicação oral entre dois seres que se atiçam é o tempero do amor. Não se pode chamar esse comportamento de conservador, mas simplesmente uma postura grandiloquente de um amor maduro.

Foi a partir dessa relação amorosa entre os parceiros que a prefaciadora Lourdinha Leite Barbosa definiu o resultado dessa latência conjunta. "Em todos os homens há três formas de erotismo: o erotismo dos corpos, o erotismo dos corações e o erotismo sagrado".

Depois a analista conclui que, em "Canção do Amor Inesperado", predomina o erotismo dos corpos. E realmente as impressões sensoriais envolvem olfato, tato, paladar e audição. Mas interessante é que na audição é onde mais se alojam essas impressões fazendo com que o erotismo venha montado no arcabouço verbal. Assim sendo, o erotismo também vagueia pelos corações.

Esse erotismo é transgressor porque se apodera de uma situação que tradicionalmente era comandada pelo parceiro. A mulher era coadjuvante na cena amorosa. Em Regine Limaverde, desde seu primeiro livro, é ela a timoneira, a rainha do venustério. É tanto que ela vai do Tânatos ao Eros como comandante em chefe. Em "Eternas Lanternas do Tempo", comandou e venceu o luto, com a palavra, com a memória do amado partinte. Venceu a melancolia, amordaçando o Tânatos com os poderosos laços verbais. Isso prova que da dor ao prazer seu bacamarte é o signo verbal.

Esse signo verbal tem sido utilizado por Regine Limaverde através das mais variadas formas como ele pode se apresentar. Tem utilizado no gênero narrativo, tem sido explorado cientificamente nas suas dissertações e teses em todas as suas pesquisas do ensino universitário. É entretanto na poesia que a palavra mais incrementa sua vida literária.

Assim sendo, seu verso transfigura situações de amor e morte com a mesma desenvoltura, provando que seu artesanato verbal a tem tornado exímia no ofício de escrever.

O que impressiona em Regine Limaverde é esse salto de um livro a serviço de uma catarse de um coração despedaçado, e menos de dois anos depois apresentar outro com celebrações amorosas marcadas por exuberante erotismo. Nessa "Canção do amor inesperado", as sombras anteriores se esgarçam e ela canta agora suas evoluções e do parceiro na relação amorosa. Fala na "adaga" do amado, confessa ser capaz ainda de causar tempestade, não se vê fruta madura e confessa que suas terras estão a esperar o plantio do parceiro. Seu poema "Ardência" é a culminância do livro. É também a valorização maior da palavra.

Esse poema torna-se antológico porque comprova que o tempero maior do amor ainda pode ser a palavra. É a valorização da palavra, como a mais forte das preliminares para a relação amorosa, que faz desse livro de Regine Limaverde uma bela canção de amor em tempos de maturidade.


FONTE: Jornal Diário do Nordeste - 24/06/14.


 

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