top of page
  • Foto do escritorBatista de Lima

Fontes da poesia de Eduardo

Batista de Lima



O primeiro referencial do mais recente livro de Eduardo Fontes é a homenagem ao centenário de nascimento de seus pais, Humberto e Carmelita. Pressupõe-se então que sejam textos circunstanciais, mas não são. É que o livro é em homenagem, mas os poemas são "Devaneios", os mais variados. A coletânea vem dividida em três partes: "A voz do espelho", "Dos devaneios e do devanear" e "A lição do espelho".

A edição ficou por conta da Expressão Gráfica e Editora, neste 2017. São 150 páginas que vêm compor sua 17ª publicação, iniciada em 1967 com "Exaltação à vida", poesias.

Ao longo desse período, o autor publicou dezessete livros de poemas, crônicas e ensaios, passando por levantamentos históricos. Podemos destacar "O Lagamar que eu conheci", 1974, ensaio; "O teatro de Carlos Câmara", Prêmio Carlos Câmara da Secult, 1982; "As Pouco Lembradas Igrejas de Fortaleza", História, Prêmio João Brígido, da ACI, 1983. São livros que, fugindo do viés poético, mostram a preocupação de Eduardo Fontes com os aspectos históricos da cidade de Fortaleza.

Isso, no entanto, não impede que sua atuação mais profícua seja na área da poesia. Daí que doze de suas publicações giram em torno do verso, sem contar seu "Na esquina da vida", crônicas, de 2007.

Esse seu mais recente livro traz os poemas ilustrados por Descartes Gadelha, que também elaborou a capa e redigiu as legendas. Essas legendas, que são a fala das ilustrações, trazem íntima sintonia com os textos a que se referem. É uma iconografia que, antecedendo ao poema, já traz uma intertextualidade com os conteúdos da criação de Eduardo Fontes.

Daí o leitor já deduz que Descartes analisou com profundidade cada poema para conseguir a essência de todos eles e transformar em imagem e subtexto. Esse trabalho ilustrativo minucioso ocupa as páginas pares e os poemas as páginas ímpares.

O Prefácio é de Anderson Braga Horta, da Associação Nacional de Escritores - ANE. Mineiro, radicado em Brasília desde 1960, Anderson é unanimidade entre seus pares, como poeta e pesquisador de poética dos mais festejados no Brasil. No seu Prefácio, ele fala em "lirismo nato" e "metapoemas" para qualificar a escrita do autor.

Também percorre outras obras de Eduardo Fontes para se encontrar com os textos anteriores e manter contato com os analistas daquelas obras. São eles: Francisco Carvalho, Sânzio de Azevedo, Horácio Dídimo, Dimas Macedo, Artur Eduardo Benevides, Dias da Silva, Abdias Lima, F.S. Nascimento, Jáder de Carvalho e Caio Porfírio Carneiro.

Além desses analistas de obras anteriores, nesses "Devaneios" atuais, Eduardo Fontes dedica a última parte a opiniões de renomados escritores. Myrson Lima o qualifica como "apóstolo da palavra". Sânzio de Azevedo acentua a fidelidade à simplicidade praticada pelo autor. Fernando Ximenes qualifica sua obra de "perpassada de lirismo", e uma louvação à palavra. Daniel Ciarlini se fixa na parte "metatextual" da obra. Para Dimas Macedo "o ser do existir com as palavras constitui o traço estético mais alto desse seu mais recente livro". Assim, muitos leitores, que também produzem literatura, se debruçaram sobre a obra de Eduardo Fontes e encontraram variadas qualidades no seu trabalho.

Quando perguntado sobre o teor de sua poética, o autor revela que é a forma como vê o mundo. Além disso ele afirma que "a poesia é o ápice da literatura. Tem que conter ritmo, musicalidade". Complementa sua impressão sobre si próprio, afirmando que uma de suas temáticas é a defesa do meio ambiente, "dando voz ao inanimado" como no poema "Árvores mortas".

O poema está na página 77, com o título de "Árvores" e o autor pergunta: "Por que devo criar desertos, / onde antes havia uma floresta? / Quem me deu poder para tanto? Deus ou o demônio?" O leitor chega à conclusão de que deve ter sido o demônio que se apoderou do devastador, colocando-lhe às mãos, foice, machado e serra elétrica.

Essas observações de Eduardo Fontes focam vários ângulos instigados pela sensibilidade. Exemplo disso é: "Fez-se noite, / e uma cidade nasceu / nas águas da lagoa! ..." Da mesma forma ele se sensibiliza diante do mendigo doente e versifica sobre a caridade: "Já sabeis quem eu sou / sou aquela que abraça / o irmão - leproso ou são, / e lhe paga as despesas da pensão!" Também define a solidão: "A Solidão - talhe / cortado no ventre / da existência".

Em seguida vem a saudade: "a saudade é sempre / a presença de uma ausência!". Ao tratar da mocidade ele assevera: "Uma parte de mim se foi / por medo do padre da freguesia, / do vizinho e do confrade... / e por isso metade de mim / deixei pelo caminho...".

Há também imagens inusitadas que beiram o surreal. São "altares sem santos", sonhos dentro do sonho, "a busca de um semblante", o ingresso em um quadro de Monet, namorados acendendo auroras e uma lua flertando pela janela das nuvens. Tudo isso para formar um poema líquido em que o tempo é sua principal preocupação, sinal de que a maturidade pode levar a certa liberdade de criação do tipo: "Um dia sentei à mesa, / e comi a mim mesmo". É um banquete em que as mãos vêm cheias de sonhos e a esperança vem presa aos dentes.

Todo esse périplo leva o poeta à realidade que lhe apresenta o espelho: "o espelho me trouxe / de volta, / depois do passeio / pelas regiões dos sonhos / e dos devaneios!...


FONTE: Jornal Diário do Nordeste - 14/03/2017.


 

3 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

コメント


bottom of page