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Entre versos e apelos

Batista de Lima



Luiz Mendez é aposentado do BNB, foi professor de colégios de Limoeiro, cordelista. Licenciado em Letras, também fez especialização em Ensino da Literatura Brasileira. (...) Seu livro tem surpreendentes textos literários. Apelos e versos diversos uma espécie de "dançarino no salão da linguagem" Limoeiro do Norte é a cidade cearense com o maior número de poetas per capita. É difícil se saber qual o limoeirense que não é poeta. Difícil encontrar ali, alguém que não verseje, que não goste de cordel, de rima e métrica. Dias atrás perguntei a Rouxinol do Rinaré, cordelista itinerante, onde mais ele conseguia vender seus cordéis aqui no Ceará. Ele afirmou ser em Limoeiro do Norte, e não em Juazeiro, Fortaleza ou Canindé como pensava eu. Mas isso é porque antes de produzir, o limoeirense consome poesia. Ali há famílias inteiras de versejadores de primeira. Exemplo é o trio dos irmãos Maia. Todos três na Academia Cearense de Letras, Luciano, Virgílio e Napoleão; outro trio é o dos irmãos Batista: Otacílio, Dimas e Lourival, todos já partidos desse nosso desconforto do mundo pós-moderno, e que tinham um pé em Limoeiro, outro em Taboleiro, logo vizinha. Poderíamos acrescentar aqui uma miríade de nomes, desde Társio Pinheiro, passando por outro Pinheiro, o Jorge, que perdeu o "nh" e ficou Pieiro, de escritores como Valdir Sombra, Gilmar Chaves, Arlene Holanda e Eugênio Leandro. Pois agora me chega às mãos mais um livro de um limoeirense, com surpreendentes textos literários. Trata-se de Apelos e versos diversos, de Luiz Mendes Filho, editado em Fortaleza, pelo Banco do Nordeste do Brasil, neste 2009. Luiz Mendes é aposentado do BNB, foi professor de colégios de Limoeiro, radialista e cordelista. Licenciado em Letras, também fez especialização em Ensino da Literatura Brasileira, quando defendeu monografia com o título "Tradição e Modernidade do Cordel", da qual tive a honra de ser o orientador. Neste seu livro é bom que se destaquem também a apresentação da professora Sarah Diva, da UECE, e do escritor Jorge Pieiro, seu ex-aluno. Sarah Diva, no seu texto, impressionada com sua verve poética, chama-o de "dançarino no salão da linguagem", e o tem como cantador, poeta, professor e cronista. Como professor, o testemunho é de Jorge Pieiro, que foi seu aluno no colégio Diocesano Padre Anchieta e que se impressionava com a paciência de educador que Luiz Mendes passava para seus alunos. Como cronista, quem quiser conhecê-lo, que leia, no livro, seu texto "Recordando a viola", em que ele relata fatos ocorridos durante os oito anos em que cantou ao som da viola em emissoras de rádio, formando dupla com o violeiro Osmar Lopes de Assis. Também bela é a crônica "Dorival e Helinho", onde são pungentes as armadilhas que o destino às vezes impõe às criaturas. Quando traça o perfil biográfico de algum personagem conhecido, destaca-se sua elegia ao pesquisador e produtor de cultura popular que foi José Ribamar Lopes. Há ali metáforas como "partiu em solo de clarinete, galgando cada degrau da escada celeste". Do mesmo quilate são "Crônica da buzina" e "Maria nota 10", esta marcada por um discreto erotismo. Entretanto, a curiosidade do leitor é contactar com os textos poéticos que aparecem da página 28 em diante. Em primeiro lugar, os sonetos, e é aí onde ele mantém uma regularidade de rimar sempre em descassílabos em rimas ABBA ABBA CCD EED. Esse modelo ele garante ao longo de seus sonetos sobre os temas mais variados que vão desde uma homenagem à Irmã Dulce até à crítica que faz ao transporte escolar. Entre os sonetos que se destacam é bom lembrar que, em especial, "Morrer nos mares", lembra-nos o dizer de que é doce morrer no mar. O poeta, no entanto, ao final, repele essa idéia e afirma que "E se é doce morrer no oceano/ Que seja num oceano de poesia". Outro destaque entre os sonetos é "Rio Jaguaribe", afinal, qual o limoeirense que não foi afetado pelo rio que passa em sua aldeia? O Jaguaribe, para o poeta, era "Gigante, caminhando sobranceiro/ Por sobre o leito, ou várzeas invadindo(...) / Com cara de menino trapaceiro". Mas agora com tantos açudes no seu percurso, inclusive, Orós e Castanhão, "Tu ficaste pequeno, mudo e cego/ E das várzeas não mais te assenhoreias / Eutanásia sofrida que carrego, / Pois, quanto mais ao teu lembrar me apego/ Mais tu secas e morres nas areias." Após a leitura das crônicas e dos sonetos, o leitor ingressa então no contingente dos poemas de metro variado mas mantenedores da grande influência do violeiro que o poeta um dia foi. É por isso que o autor faz questão de preservar o ritual da rima se casando com a metrificação, muitas vezes enquadrando-as em décimas com mote. Daí que se nota que o violeiro que foi um dia nunca deixou Luiz Mendes. Por isso não podem deixar de ser lidos os desenvolvimentos dos seguintes motes: "Velhice é rio que seca/ por faltar chuva de amor", "o amor da mãe da gente / Não tem outro igual no mundo", "Nasci sem nada trazer / Vou morrer sem levar nada". Assim sendo, está posto que o livro de Luiz Mendes tem um cardápio de textos para agradar aos mais variados paladares intelectuais. De minha parte, quando se trata de poesia popular tenho preferência pela sextilha, com rimas nos versos pares (2,4,6) em redondilha maior. Por isso que me impressionou esse sexteto com reflexão sobre a existência, nos moldes do Padre Antônio Tomás: "A vida é como uma ama / Que cuida dum curumim; / Como o jovem não reclama / ela age sempre assim: / Dá-lhe cedo as coisas doces / Deixa as amargas pro fim". Essa estrofe é bem representativa do pensamento de Luiz Mendes e de suas influências que detectamos, oriundas do já citado autor de "Verso e reverso", de Augusto dos Anjos, de Ribamar Lopes e de Antônio Girão Barroso. Esse manancial de variações literárias faz de Luiz Mendes Filho um escritor para ser lido, e esse seu livro é realmente um apelo para que leiamos seus versos diversos.

 

11/08/2009.

 

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