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Da revista A Província

Batista de Lima


Fundada em 1953, a revista A Província está em seu número 32. Seus fundadores foram F. S. Nascimento (hoje, na Academia Cearense de Letras), Florival Matos e Humberto Cordeiro. No momento, seu diretor e redator é Jurandy Temóteo. Só muita teimosia, persistência e abnegação, para manter, no Crato, uma revista desse quilate por tanto tempo. E o que é mais interessante é a qualidade das matérias apresentadas, bem como o valoroso perfil de seu Conselho Editorial, que mantém entre muitos baluartes da cultura caririense, figuras como o ainda atuante F. S. Nascimento, José Flávio Vieira, William Brito e José Jéser de Oliveira, entre outros.

Nesse número 32, a reportagem mais ilustrada trata da outorga do título de "Doutor Honoris Causa" à educadora Madre Feitosa, pela Reitoria da Universidade Regional do Cariri (Urca). A Madre Maria Camerlina Feitosa, natural de Tauá, onde nasceu em 1921, desenvolveu seus estudos principais e sua vida religiosa e educacional no Crato. Foi aluna no cratense Colégio Santa Tereza e depois fez filosofia na Faculdade Santa Úrsula, no Rio de Janeiro. De volta ao Crato, dedicou sua vida à educação, como professora e gestora educacional, chegando a ser diretora do Santa Tereza, do Patronato Padre Ibiapina, do Colégio Pequeno Príncipe. Por uma temporada dirigiu o Colégio Senhor do Bomfim, no Icó.

Outra personalidade homenageada na revista é o doutor João Gonçalves de Souza (1913-1979). Em artigo assinado por Melquíades Pinto Paiva, esse lavrense do distrito de Mangabeira, é apresentado biograficamente como uma das personalidades cearenses de destaque nacional e internacional no século XX. João Gonçalves teve origem humilde, mas através de muito esforço e inteligência privilegiada, começando por estudos no Colégio Diocesano do Crato, chegou a uma das diretorias da OEA, em Washington. Antes disso, porém, foi de cassaco na seca de 1932 a Superintendente da SUDENE. Chegou a Ministro do Interior no Governo Castelo Branco, mas nunca perdeu o contato com suas origens, beneficiando sua Vila Mangabeira com muitos empreendimentos saneadores.

Além dos perfis de Madre Feitosa e do Doutor João Gonçalves de Souza, a revista traz ainda artigos sobre Denizard Macedo e Catulo da Paixão Cearense. É bom saber que Denizard nasceu no Crato, em 1921, em casa situada na Praça da Sé. Foi aluno do Colégio Diocesano, na sua cidade natal, e depois, se transferindo para Fortaleza, foi estudar no Liceu do Ceará. Formou-se em Economia, área em que se doutorou. Ensinou em várias instituições de ensino de Fortaleza, cidade em que foi vereador. Pertenceu à Academia Cearense de Letras e ao Instituto do Ceará. Era monarquista e foi integralista. Faleceu em 1983. O autor desse artigo é Armando Lopes Rafael.

Com relação ao artigo "Catulo da Paixão Maranhense", de José Bezerra Neto, fica clara a polêmica em que Catulo sempre estava envolvido com relação ao direito autoral dos seus parceiros. Entretanto, sua genialidade suplanta qualquer dúvida que se tenha sobre suas músicas. Tendo nascido em 1863 em São Luís, no Maranhão, não se pode esquecer que seu pai era cearense. Sua composição "Luar do Sertão" se tornou um sucesso até hoje conhecido do público. Com seu porte avantajado, por necessidade, começou sua vida de trabalhador no Cais do Porto do Rio como estivador. Depois, como poeta, músico e violonista foi admirado e aplaudido até por Alberto Nepomuceno. Catulo foi genial.

Compromissada com o regional, a revista A Província, não esqueceu de fazer uma leitura de fatos históricos do Cariri. Um deles trata da passagem do Beato Zé Lourenço pela Fazenda Serra Verde. O Beato esteve na Fazenda por volta de 1939, acompanhado de 9 mulheres, que cuidavam de sua alimentação e o acompanhavam nas orações. O interessante nessa matéria é que o foco principal de sua narrativa volta-se para mostrar como funcionava a grande fazenda. Eram 22 mil hectares de terras boas no município de Caririaçu em que viviam 1 mil famílias em 700 casas. A fazenda foi adquirida pela família Boris ao Coronel Belém, do Crato, por 50 contos de réis. Essa matéria de Claude Bloc Boris traz memórias da família francesa no Cariri.

Esse número de A Província traz, como se vê, muitas matérias ricas de historiografia. Não se pode negar também seu viés bairrista, tendo em vista que o Crato é o foco principal de suas matérias. E isso fica mais evidente no seu texto culminante, "Guerra do Juazeiro (também) contra o Crato", de Juarandy Temóteo. Pode-se dizer que o diretor da Revista se esmerou nesse ensaio com novos detalhes sobre o ataque ao Crato e a tomada da cidade pelos 750 romeiros de Juazeiro, a mando de Floro Bartolomeu e acobertados pelo Padre Cícero. Esse ataque, ocorrido em 23 de janeiro de 1914, terminou por se tornar uma verdadeira pilhagem em torno do patrimônio de quem fosse partidário de Franco Rabelo.

O lema dessa revista é "o universal pelo regional". Coerente, pois, com esse objetivo embutido, verifica-se que não precisa ser cratense para ser alcançado pelos conteúdos do periódico. Os assuntos tratados, na sua maioria, extrapolam o regional e têm essa conotação universal. Além disso, há o exemplo de perseverança dos seus editores em manter no interior do Ceará, uma revista de tão longo alcance. Isso mostra que o Cariri é inesgotável como celeiro de temas históricos de relevância. A religiosidade, os mitos que se entrelaçam nas suas trajetórias, tudo leva a crer que nunca faltarão temáticas de sustentação para que A Província continue a desafiar o tempo e as dificuldades, sempre engrandecendo essa nação Cariri.


FONTE: Jornal Diário do Nordeste - 14/04/15.


 

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