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Da leitura à escrita

Batista de Lima




A arte de escrever possui uma ligação íntima com a prática da leitura. Escreve bem quem lê habitualmente. É preciso, entretanto, entender a leitura não apenas como restrita ao livro, mas também como entendimento do mundo do nosso entorno. Por isso que a natureza é um dos mais completos tesouros para nosso aprendizado. As pessoas também se constituem em verdadeiras fontes para leituras. Porém, está nos livros a fonte mais acreditada dos saberes. Impresso ou não, o livro ainda é a base principal em que se fixa a leitura.

A leitura necessita de dois movimentos. O primeiro deles é o rastreamento do texto. É uma abordagem marcada pela horizontalidade. Através dela, o leitor ausculta os potenciais da arquitetura textual. É bom tomar alguns conhecimentos sobre o autor do texto. Afinal, como a leitura é um diálogo com o autor, há necessidade de se conhecer com quem dialogamos. Também se faz necessário saber de que obra o texto foi extraído, isso no caso de ser conto, crônica ou poema, componentes de alguma coletânea. Feito esse apanhado preventivo, o leitor já pode iniciar sua leitura a partir do contato com a superfície textual.

Nesse movimento inicial de rastreamento, é importante um adequado conhecimento do código linguístico. É evidente que algum tropeço possa ocorrer nesse movimento inicial, como o desconhecimento de algum termo do vocabulário. Para isso existem os dicionários, dos quais o leitor precavido não se desfaz. Isso leva o leitor à ampliação do conhecimento da língua materna, o que vai facilitar ainda mais as próximas leituras. Nessa facilitação, até o ambiente de leitura precisa se adequar a um princípio de reflexão. Um ambiente físico conturbado dificulta a reflexão a que se propõe a leitura.

O segundo movimento da leitura é a prospecção. É através dela que o leitor mergulha no texto, buscando as preciosidades do entendimento da mensagem. Nesse mergulho, a bagagem lectural do leitor é fundamental. É que leituras anteriores de outros livros podem facilitar o entendimento de novas leituras. Afinal, há uma capilaridade entre os livros. É o que os críticos chamam de intertextualidades. Daí que só dispõe desse recurso quem possui variadas leituras anteriores.

Portanto, a prospecção termina por ser ilimitada, pois depende do potencial do texto e do cabedal de conhecimentos do leitor.

Feito isso, o leitor já pode enveredar pela escritura. Sua visão de mundo adquirida vai facilitar a criação de um novo escrito que pode ser de aceitação do que foi lido ou de rebeldia na discordância do que leu anteriormente. É claro que para a criação literária, a rebeldia é mais produtiva e desperta mais a curiosidade de quem vai ler. Concordar é muito fácil, pois é como saborear o prazer de um prato que já veio preparado. Acontece que recriar uma ideia, dando-lhe novas feições, além de ser mais difícil, é o que provoca a curiosidade dos futuros leitores.

No ato de escrever precisa que forma e conteúdo se coadunem em perfeita harmonia. Para isso o criador do texto precisa trabalhar com afinco algo que às vezes é produto de uma inspiração.

Portanto, inspiração e transpiração podem ser as fontes criativas de quem escreve. Há quem defenda que a arte da escrita é produto apenas de um trabalho. Outros, no entanto, defendem que a inspiração é ponto inicial de quem vai escrever. Independente dessa polêmica, escrever requer uma certa ambientação e, às vezes, até um estado de espírito propenso à criação.

O ato de escrever tem semelhança com a culinária. Afinal, mesmo o escritor sendo seu primeiro leitor, ele escreve para o outro. Para isso ele prepara seu texto como quem prepara um quitute para o agrado de um comensal. É importante, portanto, temperar o texto para lhe dar sabor. O saber possui o seu sabor. A sabedoria é saborosa. Ler se torna uma degustação. Ler se torna um ato prazeroso porque o texto possui o seu prazer. A forma textual bem preparada é o caminho primeiro para se alcançar o prazer do leitor, que começa no prazer do escritor diante de sua arte.

Para se alcançar o prazer do texto, que começa com os sabores que os saberes transportam, é preciso caprichar nos ingredientes que compõem essa culinária. Tudo começa com as palavras escolhidas, que, ao se darem as mãos, promovem as frases conteudísticas. Essas frases se entrelaçam para formarem os parágrafos, que, por sua vez formulam o texto final. Para que tudo isso dê certo, é necessário um bom motivo para a celebração. A celebração temática é que leva à escolha certa da forma e instaura o conteúdo. Todo esse ritual é produto de um aprendizado que começa bem antes, quando brota no indivíduo o gosto pela leitura, a amizade para com os livros. FONTE: Jornal Diário do Nordeste - 06/03/2018.

 

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