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Cariri Braúna

Batista de Lima




Cariri Braúna era o "nome de guerra" do cratense José Carvalho de Brito, quando fazia parte, como "padeiro", da Padaria Espiritual, em Fortaleza. No Crato, ele veio ao mundo em 11 de fevereiro de 1872. Faleceu no Rio de Janeiro em 15 de dezembro de 1933. Folclorista, entre suas obras está um clássico da nossa cultura sertaneja, cujo título é "O matuto cearense e o caboclo do Pará". Esse livro influenciou muitos escritores nordestinos, inclusive Leonardo Mota e Câmara Cascudo.

Leonardo Mota o chamava de "irmão de matutices", "vero didata da brasilidade" e "professor de cearencismo". José Carvalho tinha uma predileção especial por Juvenal Galeno. Considerava-o o maior poeta do seu tempo. Foi por isso que tudo fez para aproximá-lo do jovem poeta iniciante Patativa do Assaré.

Tudo começou quando Carvalho, que à época morava no Pará, 1929, levou Antônio Gonçalves da Silva para se apresentar no Norte. Lá impressionou-se ainda mais com o jovem poeta caririense. E assim comparou seu canto aos gorjeios da patativa, pássaro encontradiço na Serra do Araripe. Foi assim que Antônio Gonçalves da Silva virou Patativa do Assaré para o resto da vida.

Mas não ficou só nisso. No retorno de Patativa ao Ceará, José Carvalho enviou carta de apresentação a Juvenal Galeno para que o mesmo recebesse e conhecesse o poeta de Assaré. E assim, Patativa, em 1929, apresentou-se a Galeno e teve afetuosa recepção. Segundo Patativa, Juvenal Galeno, naquela tarde, estava sentado numa rede branca, todo vestido de branco, de barbas brancas, tendo ao lado sua filha Henriqueta Galeno, que tudo escrevia a pedido do pai, que a essa época estava cego, acometido que fora de glaucoma. Patativa tanto impressionou-se com aquela imagem que dizia ter parecido com um profeta das histórias da Bíblia, aquele Juvenal Galeno.

Voltando a José Carvalho, consta que foi renhida sua participação na luta contra a Bolívia, na disputa pelo território do Acre. Esse território incorporou-se definitivamente ao domínio brasileiro graças aos cearenses seringueiros da região que lutaram patrioticamente pela libertação. Pois nosso cratense estava lá de arma em punho, lutando pelo engrandecimento da nossa pátria.

Além de guerreiro, fora também tabelião, advogado, jornalista, literato, deputado estadual em estados do extremo-norte. Isso tudo além de padeiro do espírito, na Padaria Espiritual criada por Antônio Sales.

José Carvalho ingressou na Padaria Espiritual na sua segunda fase, a partir de setembro de 1894, já com o epíteto de Cariri Braúna. Nas reuniões de que participou, geralmente lia um de seus trabalhos em forma de conto ou poema popular, mas principalmente com um toque de humor que lhe era característico. Também é importante saber que havia interrupções de sua frequência por conta de viagens que fazia principalmente ao Crato. Carvalho era um homem irrequieto. A partir de agosto de 1895 os padeiros passaram a aparecer nas Atas da Padaria com seus nomes próprios, inclusive Cariri Braúna, que voltou a ser José Carvalho na sua assiduidade naquele Grêmio Literário.

Até setembro de 1897, José Carvalho esteve frequentando a Padaria Espiritual, e sempre interpretando suas produções. Muitos desses seus trabalhos foram enfeixados em seus livros, editados posteriormente. Sua bibliografia se inicia com a publicação de "Perfis sertanejos", em 1897. Depois publicou um opúsculo com o título "Pero Coelho", em 1903. Ainda teve "A primeira insurreição acreana", em 1904. Em homenagem à guerreira caririense publicou "Dona Bárbara", em 1917.

Finalmente, em 1930, surgiu o mais importante dos seus livros, "O matuto cearense e o caboclo do Pará". Toda essa sua produção literária é merecedora de reedição, principalmente esse seu último livro, tão inspirador para outros escritores.

Crato, Belém, Acre, Fortaleza e Rio de Janeiro são cenários em que pontificou a figura de José Carvalho. Sempre curioso e interessado pela cultura de raiz do nosso povo do sertão, ia anotando tudo e divulgando entre os que lhe cercavam.

Prova disso é que, na sua atuação na Padaria Espiritual, era quem alimentava "O Pão", órgão de imprensa da Padaria, com as trovas e poemas populares que descobria entre o povo. Os tipos populares que mais divulgou foram o seringueiro, o vaqueiro, o jangadeiro e o cantador popular.

Pesquisou através da tradição oral, tudo que foi possível sobre o célebre cantador cratense José de Matos. Da mesma forma, divulgou o que foi possível da produção artística de Catulo da Paixão Cearense.

Vítima de perseguições políticas na Revolução de Trinta, José Carvalho se viu só e vivendo muito pobre na casa de uma irmã, em Fortaleza. Não resistindo a esse desamparo, fugiu para o Rio de Janeiro, onde morreu no ostracismo.

Por ocasião de sua morte teve homenagem significativa proferida em belo discurso de Leonardo Mota no Instituto do Ceará e publicado na revista daquela entidade cultural. Entretanto, o Crato que ele tanto amou ainda lhe deve algum reconhecimento. Na cidade em que nasceu ainda não teve direito ao seu último repouso.

Também a reedição de suas melhores obras é uma dívida que ainda temos para com ele. Isso sem falar que o ambiente universitário de sua cidade mãe é um laboratório em que a análise de sua produção literária ainda continua terreno indevassável.


FONTE: Jornal Diário do Nordeste - 05/07/2016.


 

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