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Biografia do Padre Palhano

Batista de Lima




O levantamento biográfico de uma personalidade requer isenção de ânimo do biógrafo. O leitor precisa se defrontar com a cristalina verdade que envolve a trajetória de vida de quem é apresentado. Diante disso pode-se dizer que o leitor desse livro de César Barreto Lima, em parceria com Saulo Barreto Lima, fica de oitiva ao iniciar a leitura de "Padre José Palhano de Sabóia, santo, semideus ou cavalheiro do apocalipse?". É que o maior adversário de Palhano foi exatamente o pai do autor, Cesário Barreto Lima. Será, pois, que as querelas políticas não comprometem essa biografia do polêmico padre?

Para surpresa do leitor, o livro de César traz agradecimentos iniciais a mais de 70 pessoas, a partir de sua mãe, mas seu pai e seus dois tios, que contribuíram para a cassação de Palhano, não aparecem na lista. Essa atitude já põe uma certa confiança no numeroso cabedal de informações em torno da personalidade do padre político. Como não se tem conhecimento de outro trabalho tão rico em detalhes sobre a figura do protegido de Dom José Tupinambá da Frota, suas 358 páginas configuram detalhado perfil do padre, prefeito e deputado. É evidente que os leitores vão se dividir na defesa e na acusação de Palhano, mas sua vida foi assim, sempre dividindo opiniões.

José Palhano de Sabóia foi adotado pelo bispo de Sobral, Dom José Tupinambá da Frota, ainda aos 13 anos. Essa adoção ocorreu em 1935, tendo em vista que Palhano havia nascido em maio de 1922. O bispo queria torná-lo padre e talvez até seu sucessor na diocese. Para isso colocou-o no Seminário São José, de Sobral, e posteriormente no Seminário da Prainha, em Fortaleza, de onde terminou sendo expulso. Palhano, todo fim de semana, viajava para Sobral. Esse comportamento desagradou seus superiores em Fortaleza. Entretanto, continuando seus estudos em Sobral, terminou se ordenando padre em 1945, sendo, em seguida, enviado a Roma para estudos superiores.

Em Roma não passou muito tempo, regressando a Sobral, cidade dos seus folguedos. Esses folguedos constavam de desfiles de moto americana pelas ruas da cidade, possuir carro de luxo importado e um avião para voos em que, além do bispo, em outras oportunidades, conduzia moças bonitas. Segundo César Barreto, às vezes citando Lustosa da Costa, Palhano vivia no limite entre o sacro e o profano. Sua vida religiosa se confrontava com uma postura quase dissoluta algumas vezes. Foi, no entanto, seu ingresso na política, que suas inquietações canalizaram-se para um olhar mais comprometido com a assistência aos pobres e desvalidos. A população periférica de Sobral o aclamava por essa atitude.

Os autores do livro são originalmente descendentes de adversários ferrenhos do padre. Portanto, por mais que se eximam de destratar o sacerdote adversário de seus ancestrais, não explicitam com ênfase as qualidades de Palhano. É tanto que a eleição do biografado, para Prefeito de Sobral, é atribuída quase que exclusiva ao envolvimento de Dom José na campanha. Há testemunhas acreditadas que citam o carisma de Palhano, sua gentileza e ajuda para com os pobres, sua oratória privilegiada, seu amor pela cidade de Sobral e sua tenacidade na hora de enfrentar problemas. Mais da metade da cidade estava de seu lado.

Prova do prestígio e da competência de Palhano é que na sua eleição para deputado federal, com expressiva votação, já não contava com a ajuda de D. José que havia falecido três anos antes. É bem verdade que seus dois mandatos políticos não foram concluídos. Havia renunciado ao cargo de prefeito e teve o mandato de deputado federal cassado pela Revolução de 1964. No episódio da cassação, atribui-se a dois irmãos de Cesário Barreto, militares dos altos escalões do Exército, interferência junto ao governo militar para a interrupção do mandato do Padre, bem como a interdição de seus direitos políticos por dez anos.

Sem mandato e sem direitos políticos, segundo César Barreto, Palhano dedicou-se a seu programa "A hora da verdade", na Rádio Tupinambá de Sobral. Produto de sua fundação, esse veículo de comunicação passou a criticar o clero sobralense, em especial o bispo Dom Valfrido Teixeira.

Chegou a tal nível essa polêmica, que Palhano terminou por ser proibido de celebrar e oficiar sacramentos. Estava a esse tempo já formado em Direito, pela Faculdade Cândido Mendes, do Rio de Janeiro, graduação conseguida em 1972. Entretanto, diante de tantas atribulações sofridas, nosso padre teve que enfrentar a falta de recursos e, principalmente, conviver com forte diabetes de que viria a ser vítima aos 60 anos, em 1982.

Ao final da leitura desse livro de César e Saulo Barreto Lima, o leitor, isento das paixões políticas que envolveram a figura do biografado, pode imparcialmente opinar sobre tudo que leu.

Primeiramente, os autores ou a RDS Editora poderiam ter sido mais rigorosos com a revisão ortográfica. Em segundo lugar, o fato dos autores fazerem parte do clã que mais oposição fez ao padre, dificulta a total imparcialidade na abordagem do tema. Mesmo assim não se pode negar o trabalho dos dois autores em relatar a trajetória de vida de José Palhano de Sabóia, indo muitas vezes se abeberar de fontes primárias para enriquecer a narrativa. É portanto esse livro um importante documento historiográfico de Sobral com vários documentos inéditos sobre personagens importantes na história da cidade. Esse livro sobre Padre Palhano contribui para fortalecer a mitologia sobralense e engrandecer o caráter telúrico daquele povo denominado de sobralidade. FONTE: Jornal Diário do Nordeste - 03/04/2018.

 

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