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As mulheres do SIN

Batista de Lima



São duas as mulheres participantes do Grupo SIN, Leda Maria e Inês Figueiredo. Esse grupo literário cearense teve seu funcionamento restrito ao ano de 1968 e teve além das duas citadas autoras, a participação de Barros Pinho, Horácio Dídimo, José Leão Júnior, Linhares Filho, Pedro Lyra, Roberto Pontes, Rogério Bessa e Rogério Franklin. Pelo menos esses são os nomes que constam da publicação mais importante do grupo, no caso, a Sinantologia, uma coletânea de poemas, publicada em 1968, pela Imprensa Universitária do Ceará. Os autores aparecem, na antologia, em ordem alfabética, o que leva ao aparecimento de Inês Figueiredo antes de Leda Maria. Maria Inês Aguiar de Figueiredo, fortalezense, na época, era concludente do curso de Direito, da Universidade Federal do Ceará. Seus poemas não definem uma temática unificada, mesmo assim, há uma fala que a identifica quando a solidão é o tecido sobre o qual ela borda fios poéticos. ´Quero verso/para ouvir meus acordes/e deixar meus cabelos crescerem coloridos´. A solidão não é apenas sentida, mas desejada também. ´Quero viver só/para espalhar meu eu em mim/e apalpar o mundo com isto´. Narcísica, a autora primeiro quer devassar a si própria, porque sabe que o belo, o poético, e o amenizar de suas dores podem ser encontrados em si própria. Esse é um lado pedagógico de seu poema. A pedagogia poética educa primeiro o próprio autor e é aí onde se instala Inês Figueiredo. Ela faz uma poesia de preparação. Ela primeiro se prepara para debutar no canto geral das dores do mundo. Porque entre elas está a dor da poeta. Primeiro ela precisa se transfigurar para depois cuidar das dores dos outros. Inês Figueiredo não foi incluída no número da Revista de Letras, comemorativo dos 25 anos de fundação do Grupo SIN. Daí que só podemos observar, como participante do grupo, seus poemas veiculados na Sinantologia. Sua opinião sobre a participação no grupo, nas suas reuniões, inclusive, é de que havia um domínio da voz masculina que tudo resolvia, que tanto ela como Leda Maria, mesmo participantes, tinham pouquíssima participação nas decisões que eram tomadas pelos outros membros. Apenas participaram com poemas e pouco com opiniões. Mesmo iniciante, naquele momento, na arte poética, Inês Figueiredo já apresenta uma linguagem metafórica que instaura o poético num refazer da linguagem. Ela traz imagens como: ´Sorrisos retidos/em fiapos lassos´, ´melodia plena de acordes´, ´louca certeza´, ´utópicos cajados´, ´dorso do tempo´, ´fala das horas´. Outra faceta que chama a atenção, para os poemas de Inês Figueiredo, é o ritmo. Talvez por influência da Bossa Nova, com seu ritmo musical que soou nos ouvidos de toda uma geração, e influenciou-a, inclusive, tem-se na sua poesia uma impressão de que são letras feitas para músicas de João Gilberto, Tom Jobim e Carlos Lira. Há uma predominância de redondilhas, tipo de verso propício para musicar. Essa musicalidade assim se apresenta: ´cinzenta de tanto ser/menina cinzenta agora/o soluço dos teus passos/já marcam todo o compasso´. Depois do SIN, Inês alçou voos sozinha, com participação em antologias e a edição de livros, impondo-se como uma das gratas presenças femininas na literatura cearense. Com relação a Leda Maria, observa-se uma maior experimentação, talvez ainda encantada com os últimos suspiros da moda concreta. Com uma atuação jornalística já concretizada, ela estava antenada com as vanguardas que ainda teimosamente vigoravam na época, entre elas, o Concretismo. Daí suas montagens poéticas onde as palavras se alinham muito mais em nome de uma estrutura do que verberando profundidades. Quando se liberta do arcabouço formal, consegue demonstrar que também sabe mergulhar em busca de pérolas poéticas que jazem nas camadas mais profundas do poema. É notável seu desempenho no poema ´Canto´, onde ´A carne pálida de medo/nada fecunda´. Esse seu poema é um canto à liberdade, tão vilipendiada entre nós, naquele tempo, final da década de 1960. Quando o cantar a liberdade não a satisfaz, vem então a ressaca do pessimismo: ´Hoje/não existe tempo para mais nada/já matamos/já destruímos/já paramos/e/de nada adiantará/querer edificar templos´. Essa mesma tonalidade está no seu poema número um, publicado na revista ´O Caboré´, número 3, quando ela afirma ser ´Inútil/alimentar esperança/se ela é suicídio. (..) Inútil/colher tua mão/sem poder retê-la´. Essa revista, de março de 1968, é uma publicação do Departamento Cultural do Diretório Acadêmico 25 de junho da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, da UFC, editada pela Imprensa dessa Universidade. O que se constata, é que a publicação demonstra ser um embrião do que viria a se tornar a Sinantologia e o Grupo SIN. Nela, Leda Maria aparece com dois poemas que mesmo anteriores, não aparecem na Sinantologia. No segundo poema, a mesma conotação pessimista e angustiante do primeiro aparece com mais força. ´Um som agudo/estremeceu o canto/bebi o medo... o desânimo´. Até a noite é um tecido de tristezas e angústias. ´Agora/o canto de outrora se faz ao longe/ o homem se faz ao longe/o homem se fez tristeza/os minutos/tempestades que se espalham/e destroem o tempo/dentro da noite gelada´. Não é sem razão que Artur Eduardo Benevides afirma na Revista de Letras, que Leda Maria, na sua poesia, tem a consciência e ´o sentido de proporção do trágico e do belo´. Já Juarez Leitão, no mesmo periódico, detecta ´O sensualismo, a afetividade, a provocação e o belo que se incluem no roteiro espiritual que verbaliza´. Após a leitura dos versos de Leda Maria conclui-se que já chegou a hora dessa escritora reunir em livro todos os seus poemas escritos desde essa época inicial em que, ao lado de Inês Figueiredo, impôs uma voz feminina e lírica no grupo Sin, cuja maioria de seus componentes era de sisudos rapazes de letras.

 

17/02/2009.

 

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