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A saga de Jesuíno Brilhante

Batista de Lima




Nove anos durou a saga cangaceira de Jesuíno Brilhante. Iniciou-se no Rio Grande do Norte, onde nasceu o cangaceiro, e terminou na Paraíba onde foi assassinado. Dois episódios históricos fazem parte da trajetória desse "cangaceiro romântico": a Revolução Quebra-Quilos e a terrível seca de 1877, 1878 e 1879. O livro narra os fatos que marcaram a luta contra a implantação do Sistema Métrico Decimal, e o episódio da grande seca de 1877 em que Rodolfo Teófilo teve participação especial na assistência das populações atacadas pela fome e pelas doenças.

Foi Rodolfo Teófilo que em 1895 trouxe a lume o livro "Os Brilhantes", contando a história desse valente filho da cidade de Patu, do Rio Grande do Norte. Nascido em 1844, Jesuíno foi morto em 1879, em Brejo da Cruz, na Paraíba. Segundo o romance de Teófilo, esse valente nordestino foi traído por um dos seus cangaceiros de nome Cobra Verde. E eram poucos os seus acompanhantes nas lutas que desenvolveu em nome de uma vingança entre famílias que se digladiavam. Eram os Brilhantes contra os Calangros. A primeira morte praticada entre esses clãs foi por parte dos Calangros, o que levou Jesuíno a continuar a matança.

Já na quinta edição, essa obra de Rodolfo Teófilo oscila entre realidade e ficção, ao longo de 406 páginas, editada desta feita sob os auspícios da Academia Cearense de Letras e da Fundação Demócrito Rocha. O Prefácio é de Sânzio de Azevedo que além de conhecer em detalhes as histórias dos Brilhantes, guarda distante parentesco com o clã de Jesuíno. No seu texto, o professor Sânzio apresenta detalhes verdadeiros da família e do cangaceiro, que justificam o rosário de desavenças em que se meteu Jesuíno, bem como as perseguições e injustiças que sofreu em sua atribulada e curta existência.

Essa obra, de cunho naturalista, como outras de Rodolfo Teófilo, apresenta Jesuíno como produto de um determinismo social que caracterizou muitas situações similares no Nordeste. São famílias vizinhas que se desentendem por questões de limites ou de haveres e que resolvem suas questões através dos bacamartes, com baixas dos dois lados. Os governos constituídos geralmente se omitiam para posteriormente aderirem ao que saísse vencedor da contenda. Assim, nossa região foi palco de verdadeiros morticínios por falta de diálogo ou intermediação do poder público.

No caso dos Brilhantes, o poder repressor estava mais empenhado em respaldar seus adversários, os Calangros. Daí ter sido inglória a tentativa de Jesuíno de encetar sua vingança preservando a família. É tanto que eliminando oficiais e mais de duas dezenas de soldados, além de alguns Calangros, o "cangaceiro romântico" sucumbiu ao poder ao qual não se submeteu. Nos seus nove anos de combates, nunca se acompanhou de mais de dez companheiros de lutas, entre os quais havia parentes, escravos e uns dois ou três aventureiros mercenários, entre os quais, o seu traidor.

A culminância de suas estratégias aconteceu na cidade de Pombal, na Paraíba. Apesar de haver alguma diferença bastante simples entre a narrativa de Teófilo e o fato real acontecido, Jesuíno atacou aquele contingente policial para a libertação de gente de sua família. Ele, com seu pequeno grupo, conseguiu invadir aquela delegacia protegida por mais de duas dezenas de policiais e sair incólume após libertar todos os presos. Esse ato de aventura e mais outros instigavam cada vez mais a irritação da polícia que ainda contava com a adesão voluntária dos civis da família dos Calangros.

Há, entretanto, o lado romântico na vindita de Jesuíno contra as injustiças sofridas por sua família. É que na grande seca de 1877, em que ocorreu verdadeira catástrofe no Nordeste, os benefícios enviados pelo governo para socorrer os flagelados eram desviados por políticos espertalhões e não chegavam aos mais necessitados. Jesuíno com seu reduzido bando chegou algumas vezes a atacar esses comboios para em seguida distribuir os víveres com os desvalidos que se aglomeravam às margens das ribeiras. Essa sua atitude ampliou o mito que o cercava no seio das populações pobres.

Esse romance de Rodolfo Teófilo, mesmo com suas quatro centenas de páginas, não cansa o leitor. Afinal, não são apenas as lutas de Jesuíno Brilhante que prendem o leitor ao texto. É que há muitos conhecimentos paralelos que interessam a quem quer conhecer o sertão nordestino. A curiosa culinária cangaceira, a fauna e a flora vão se erguendo à proporção que o leitor mergulha no texto. Acontece, entretanto, que é a seca em que mais se empenha o autor para mostrar os horrores da fome e a devastação da natureza. É nesse aspecto que Rodolfo Teófilo produz um fio condutor entre esse livro e seu clássico "A fome". Assim, é importante a leitura de "Os Brilhantes" para que melhor se conheçam as origens da nossa constituição social.


FONTE: Jornal Diário do Nordeste - 16/05/2017.


 

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