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A fala pela pena

Batista de Lima


A fala é o ponto de tensão entre o indivíduo e a sociedade. É uma construção pessoal. Cada indivíduo tem sua fala, seu comportamento. A escrita é uma fala. Para que se comprove isso, basta verificar que não há duas pessoas que escrevam exatamente igual. Essa diferença entre as escritas é o caráter pessoal de quem escreveu. É nesse diferencial que se baseia o estilo. O estilo é, pois, uma fala. Daí que o que mais chama a atenção do analista numa análise de textos é o estilo do seu autor. Foi por isso que ao ler "A fala e a pena: para além do bonde", de Tales de Sá Cavalcante, procurei esse caráter pessoal do autor como porta de entrada para compreender seu texto. A primeira preocupação foi entender esse subtítulo da obra; "Para além do bonde". Por que a palavra bonde aparece na capa?

Esse subtítulo "Para além do bonde" remete a uma memória familiar. Tales, que veio ao mundo em 26 de janeiro de 1950, é o terceiro filho de Ari de Sá Cavalcante e Hildete Brasil de Sá Cavalcante. Acontece que seu pai manteve uma coluna no jornal "O Estado", entre 1940 e 1945, onde escrevia sob o pseudônimo de "Tales", e essa coluna tinha como título "Para ler no bonde". Daí então o nome do filho e agora o subtítulo que é colocado no livro. Essa memória também aparece nos nomes dos colégios do grupo.

É por isso que depois de quarenta e cinco anos de atuação no colégio, Tales pode escrever sobre educação. Sua experiência como educador o credencia a escrever sobre temas pedagógicos da atualidade. Entre suas crônicas é preciso que se destaquem aquelas que são fruto de sua prática do dia-a-dia. Seus discursos de colação de grau das turmas concludentes da Faculdade Farias Brito são textos de alto valor pedagógico que esclarecem o formando nesse momento crucial da vida em que os jovens, em um rito de passagem dos mais simbólicos, saem com um diploma na mão, as ideias na cabeça e a expectativa diante do concorrido mercado de trabalho.

Outros temas são abordados por Tales de Sá Cavalcante, colocando sua opinião e se posicionando em torno de assuntos polêmicos. Um deles é sobre "O Enem no vestibular", quando sua opinião entra em confronto com alguns áulicos do poder central que vivem criando novidades educacionais enquanto a aprendizagem não progride. Nesse mesmo patamar estão suas opiniões sobre humoristas na política, quando acertadamente conclui que Paulo Diógenes, eleito vereador nas últimas eleições pode se tornar um atuante vereador de Fortaleza, com o mesmo exemplo de Tiririca, eleito para Deputado Federal. Sabe-se que de princípio, a eleição do Tiririca chegou a ser motivo de chacota e hoje é considerado um bom Deputado Federal.

Um momento também revelador do livro ocorre quando Tales passa a falar de si próprio e da empresa educacional que dirige. Esse momento está presente nas entrevistas que se encontram no final da publicação. É nesse momento que o leitor se depara com uma trajetória de trabalho, garra e sucesso de alguém que foi lapidado para educador. Formado em Engenharia Civil, desde cedo no entanto dedicou-se à educação. Nasceu dentro de um colégio. Afinal, o Farias Brito foi fundado em 1935, quinze anos antes do nascimento de Tales. Hoje o colégio com mais de quinze mil alunos educa da criança a partir de seus quatro meses de idade à conclusão de seu curso superior.

Essa preocupação com a educação de nossa juventude passa também pela preocupação com a cidade de todos nós, Fortaleza. Esta cidade e seus problemas de mobilidade. A cada dia nossa urbe diminue seu passo como em um envelhecimento precoce. Não há praças para o povo, nem calçadas e o mar é encoberto por prédios altíssimos. A natureza escondeu sua face. Não há nem ciclovias para o meio de transporte ecológico e saudável da bicicleta. Como Tales se exercita diariamente pedalando, conhece muito bem esses problemas. Seu texto é um protesto contra essa insensatez de desconstruirmos a vida ao construirmos nossa cidade. Já há quem diga que Fortaleza é uma boa cidade para se viver nos fins de semana pois dela ficamos longe, nas praias do leste e nas do oeste.

De todas as crônicas, no entanto, é preciso que se destaque a que traz o título "Nice day", publicada no Diário do Nordeste do dia primeiro de junho de 2008. É que naquela data, o cronista comenta a honraria a que fez jus Dona Yolanda Queiroz por parte da Câmara de Comércio Brasil - Estados Unidos. O texto enaltece a grandeza da homenageada, seu destaque no mundo empresarial principalmente o destaque do grupo Queiroz na distribuição de gás, na indústria metal mecânica, no setor agroindustrial, na educação, na comunicação e no setor de água mineral por todo o Brasil. O acontecimento havia se dado no dia 23 de maio em Nova York e contou com a presença de autoridades brasileiras e americanas ligadas ao comércio.

Como se vê, os temas tratados são atuais, coerentes com o princípio da crônica, que tem compromisso com o tempo em que é elaborada. Como literatura do jornalismo, esses textos de Tales de Sá Cavalcante foram publicados em jornais locais e são propícios a reflexões por parte dos leitores. Ademais, as mensagens de otimismo que transparecem de seus conceitos trazem um viés até didático, diante da falta de perspectiva que inibe muitas vocações ainda em seus nascedouros. Educar também é isso, propor opções ao educando, mostrar uns caminhos mais largos a serem trilhados e alertar para os perigos dos atalhos suspeitos. Tales dá conselho porque tem experiência de vida ascendente.

Ao final da leitura desta obra de Tales de Sá Cavalcante, algumas reflexões são necessárias para que se conclua como é possível se construir uma trajetória de sucesso a partir de um início marcado pela simplicidade financeira mas com a garra necessária para alcançar o sucesso. Toda sua vida e de seus ancestrais é pontilhada de dificuldades que se transformaram em vitórias. Desde o caso de seu avô, nascido em Aurora e falecido de repente nos jardins do Palácio da Luz, passando por seu pai também falecido aos 49 anos, sua vida e a dos irmãos foi de continuidade daquilo que os ancestrais deixaram como espólio maior, o saber. E como a educação é uma herança que o tempo não destrói, esse patrimônio herdado dos familiares tem progredido exemplarmente. É isso que faz de Tales de Sá Cavalcante um exemplo para as gerações de hoje. Sua trajetória de sucesso é uma aula magna para todos nós.


FONTE: Jornal Diário do Nordeste - 05/03/13.


 

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