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A arte de entrevistar

Batista de Lima


Saber perguntar é uma arte. Isso leva a entrevista a depender da qualidade do entrevistador. Difícil não é responder, difícil é saber perguntar. As interrogações é que direcionam as respostas. Entrevista não se configura gênero literário. Isso porque dificilmente perguntas e respostas guardam as mesmas características estilísticas. Afinal, quem pergunta não pode exigir de quem responde uma linguagem dentro dos seus padrões de emissor. Entretanto, saber perguntar é uma arte. Isso leva a entrevista a depender da qualidade do entrevistador. Ou seja, difícil não é responder, difícil é saber perguntar. As interrogações é que direcionam as respostas.

Isso é o que se conclui desse livro de entrevistas realizadas por João Soares Neto e que vem com o título "Gente que conta". O livro, com 256 páginas, foi editado pela Expressão Gráfica e Academia Fortalezense de Letras, neste 2010. São 16 cearenses de destaque nos mais variados setores da vida social, que abriram seus corações no diálogo com o entrevistador. Não dá, no entanto, para classificar qual a melhor das entrevistas, mas nota-se perfeitamente aquelas em que entrevistador e entrevistado ficaram mais à vontade devido a laços de amizade construídos anteriormente.

Há ainda alguns que se deixaram conduzir pelo entrevistador, de forma que o diálogo tornou-se como que uma catarse. As revelações foram aparecendo tão livres que dá a impressão de que algo terapêutico evolui da conversa entre os dois dialogantes. A entrevista com Chico Anysio, por exemplo, se torna reveladora. A revelação de seu duplo emerge em cada personagem que ele cria. Seu teatro revelador apresenta para cada personagem que cria uma máscara em que um Chico Anysio alojado na sua estrutura profunda vem à tona.

O caso de Ana Miranda é diferente, pois há um ingresso no mundo do outro sem que haja um envolvimento direto da autora. Ao longo da sua trajetória literária ela tratou de Gregório de Matos Guerra, Augusto dos Anjos e Gonçalves Dias. É claro que depois de tratar de um baiano, de um paraibano e de um maranhense é de se esperar que chegue a vez de um cearense. Na sua entrevista, ela explica essa lacuna ainda impreenchida e mostra seus projetos para o futuro onde está a solução para esse nosso desejo.

Outro que impressiona pelas respostas surpreendentes é José Alcides Pinto. Se tudo nele é fragmentado, não é surpresa que se repita na entrevista aquilo que era marcante na sua vida. Talvez seja Juarez Leitão aquele que, na entrevista, mais se aproxima do "à vontade" de Alcides Pinto. Os dois se mostram soltos nas respostas, mas Juarez não deixa de revelar seu pendor para a História. Tanto conta, às vezes inventa, como também é um conhecedor da Historia Geral e da nossa em particular.

Esse gosto pela História é o mesmo que marca a personalidade de Lustosa da Costa. Acontece que é uma história localizada. Sobral é seu norte. Representa ele, o maior conhecedor da história sobralense. É o cronista daquela cidade, e seu amor pela Princesa do Norte tinha que pontificar altaneiro na longa entrevista que concedeu. Outro afeto marcante na sua personalidade é pelo jornalismo, da mesma forma como acontece com José Raimundo Costa que mesmo na maturidade e já consagrado no jornalismo, não deixou de cursar Comunicação Social.

Quatro dos entrevistados tiveram assento na Câmara Federal e não podiam deixar de falar sobre a política cearense e nacional. Lúcio Alcântara, Marcelo Linhares, Mauro Benevides e Ubiratan Aguiar revelam, além de suas tendências literárias, dados e fatos da nossa história política, o que torna suas entrevistas verdadeiros documentos da nossa história. Há uma capilaridade que une essas quatro personalidades, que são marcantes para o desenvolvimento do nosso Ceará e para a construção de nossa memória política.

Específicas, entretanto, são as entrevistas com as outras personalidades que aparecem no livro. Artur Eduardo Benevides dá uma aula de teoria da literatura direcionada para o gênero poético. Elano de Paula fala como "compositor, escritor, pintor, engenheiro civil e financista", como afirma João Soares, e se sai bem em todas essas vertentes. Ernane Uchoa Lima é o jurista por excelência. Seu curriculum vitae é invejável na área do Direito, e seus conhecimentos não podiam faltar nas respostas. José Dias Macedo é o empreendedor exemplar para o desenvolvimento econômico do Ceará.

Com relação à história de nossa radiofonia, não se pode omitir a importância de José Júlio Cavalcante. Da mesma forma, ninguém conhece melhor a sociedade fortalezense do que Lúcio Brasileiro. Os dois completam esse elenco de personalidades trazidas até nós, por João Soares Neto, nesta sua coletânea de entrevistas. Daí que José Augusto Bezerra na sua "Apresentação" foi muito feliz ao concluir que João Soares Neto, ao promover essas entrevistas, nos presenteou com o conhecimento daqueles que "ajudaram a esculpir o Ceará mas que o autor deixou-nos apenas um débito, ao não contar sua própria história", pois João Soares Neto está á altura dos seus entrevistados.


jbatista@unifor.br

19/10/10.

 

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